Performance aborda marcas da violência contra a mulher

Nesta segunda (10), o Palacete Carmelita, espaço cultural instalado no centro de São Paulo, recebe o "Segunda da Performance", projeto mensal dedicado à performance.

A artista convidada desta segunda edição é a baiana Jaqueline Vasconcellos, que traz "Mais um Pornô" e "Cuerpo de Mujer - Peligro de Muerte". Ambos os trabalhos são fruto de uma pesquisa a respeito de violência contra mulheres iniciada há cerca de dez anos pela performer.

Em "Mais um Pornô", cuja dramaturgia é constituída de depoimentos de mulheres que sofreram algum tipo de violência, o foco é o corpo feminino. O experimento permite que o público toque, ou não, no corpo de Jaqueline —que fica deitada nua em uma mesa coberta por sushis. "Numa primeira versão, trabalhava com a plateia me tocando. O que acontecia apenas quando ela tinha minha autorização. Me incomodava muito que [na vida] as pessoas me tocassem sem que eu deixasse", conta.

Já "Cuerpo de Mujer - Peligro de Muerte" é uma espécie de instalação sonora em que as histórias contadas pelas vítimas são contrapostas por uma "voz social opressora" elaborada por Jaqueline. Temas como sexualidade, gênero, identidade sexual e tabu são colocados em discussão.

Confira entrevista com a artista Jaqueline Vasconcellos.

Segunda da Performance - Palacete Carmelita - R. Dom Francisco de Sousa, 165, região central, São Paulo, SP. Seg. (10): 19h30. 100 pessoas. Ingr.: R$ 20 e 1 quilo de alimento não perecível. Ingr. na bilheteria ou para www.sympla.com.br


GUIA - Como surgiu seu interesse em falar sobre a violência contra a mulher?
Jaqueline Vasconcellos - Há dez anos eu estava com um grupo de amigas em um bar e estávamos falando sobre sexo, namorado, mulher, e chegamos ao tema violência. Falamos principalmente sobre violência psicológica. E percebi que todas já tinham sido abusadas sexualmente em algum momento de suas vidas.

O que mais te inquieta em relação ao tema?
A recorrência dos casos. Não há classe social e nem raça para que a violência aconteça. Tenho visto que o número de mulheres de classe alta que sofrem abusos é tão grande quanto o que classes baixas, mas é mais ocultado. Além disso, o povo brasileiro desconsidera a violência psicológica. Sofremos violências cotidianos que modificam o nosso estar na sociedade.

Você coletou depoimentos para realizar as performances. As mulheres te procuram ao fim da apresentação para dividir suas histórias?
Sim. Uma vez uma senhora me procurou e gravei seu depoimento no meu próprio celular, ali na hora. E ela disse que estava me contando porque queria que todo mundo soubesse. Eu sempre pergunto se posso usar o material para as performances. Aparecem imagens fortes [nos depoimentos], como a de uma mulher de 53 anos que foi casada por 23 anos e foi espancada pelo marido durante o período. Num momento, ela diz: "ele era como um Deus caminhando pela Terra".

Para você, qual é o lugar da performance na cena artística contemporânea?
Existe uma esfera nacional de pessoas muito ativas no Brasil todo. Mas não existem políticas públicas. A performance está sempre atrelada a algum tipo de arte —normalmente artes visuais— mas não olham para ela de maneira orgânica, visando fomentar a área. São iniciativas independentes que acabam movimentando a cena, que trabalha com fronteiras muito borradas. E o hibridismo da performance é da nossa própria contemporaneidade.

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem

Últimas

Ver mais