Com inflação em alta, preços nos restaurantes e no delivery aumentam até 70% em SP

Ficaram mais caros na capital principalmente pratos que levam carnes e frutos do mar

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São Paulo

Desde julho do ano passado, quando os bares e restaurantes de São Paulo reabriram pela primeira vez após o início da pandemia, não foram poucos os movimentos de abre e fecha determinados pelo plano de quarentena do estado —o que ajudou, de certa forma, a segurar os preços por um tempo.

“Sentimos o peso da inflação e da disparada do dólar desde o ano passado. Os destilados, por exemplo, aumentaram 15% em setembro de 2020, mas não tínhamos como reajustar nossos preços porque, naquele primeiro momento, era uma retomada tímida, com mudanças frequentes nas regras. Quem ainda tinha um estoque maior conseguiu se segurar”, diz Gustavo Barakat, proprietário do bar Pé de Manga, na Vila Madalena.

Mas a trégua durou pouco —nos salões e nos deliveries, os cardápios de restaurantes e bares já acusam o golpe.

Embora a inflação acumulada nos últimos 12 meses seja de 10,25% pelo IPCA, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor, alguns insumos fundamentais para os estabelecimentos deram um salto bem maior. É o caso do salmão chileno, um dos itens básicos na lista de compras do Oguru Sushi Bar, no Jardim Paulista, e do delivery Poke by Oguru.

“Por ser cotado em dólar, o salmão ficou 81% mais caro de janeiro de 2019 até este mês. Nossa política é segurar o máximo possível, mas desde maio de 2021 tivemos de repassar uma parte para os clientes”, conta Gabriel Fullen, sócio do Grupo Locale, que comanda as duas casas.

O rodízio do Oguru Sushi Bar, que custava R$ 119 por pessoa na pré-pandemia, sai agora a R$ 159 por pessoa. Para compensar, Fullen incluiu a sobremesa no pacote —antes, o doce era pago à parte. “Alguns clientes perguntam, querem entender por que tanto aumento, mas basta falar dos preços dos alimentos para que todos se solidarizem.”

Outro ingrediente que destoa do índice oficial da inflação é a carne bovina. Nas contas do restaurante Lolla Meets Fire, no Itaim Bibi, especializado em carnes preparadas na parrilla e no pit, cortes como ancho e fraldinha já subiram 65% desde o ano passado. No caso dos frutos do mar, outra especialidade da casa, o aumento também superou a inflação e chegou a 45%.

O impacto está no cardápio do Lolla na forma de um aumento médio de 15%. O chorizo passou de R$ 79 para R$ 95, enquanto o prato de polvo, camarão, mexilhões, vôngoles, batatas defumadas e tomatinhos pulou de R$ 198 para R$ 223.

Prevendo que o reajuste pesaria no bolso da clientela, o proprietário do restaurante, Fabio Maluf, investiu em pratos alternativos, cujas receitas dependem menos dos ingredientes mais caros.

“Já tinha um projeto de levar itens inusitados para a parrilla, o que foi acelerado em função dos preços. Eles têm feito sucesso”, respira. Entre as novidades estão a alface baby grelhada, servida com maionese defumada, noz-pecã e limão-siciliano caramelizados (R$ 49), e o steak de couve-flor na brasa, acompanhada de purê de couve-flor e farofa de focaccia (R$ 37).

No Pé de Manga, as substituições também entraram na ordem do dia. O filé-mignon do almoço executivo foi trocado por baby beef e o salmão, por tilápia ou bacalhau fresco. Ainda assim, o preço do pacote, que inclui salada, prato principal e sobremesa, passou dos R$ 39, praticados em dezembro de 2019, para os atuais R$ 46.

“Tudo está mais caro, do combustível à conta de luz. E não tem sido possível negociar com os fornecedores, já que eles também foram espremidos pela pandemia e sofreram com muita inadimplência. Com medo de conceder prazo e não receber, eles preferem vender menos e receber no ato”, diz Barakat.

Negócios de pequeno porte, com salões pequenos, são os mais afetados pela disparada dos preços. No Tujuína, restaurante de 45 lugares que o chef Ivan Ralston abriu na Vila Madalena, no lugar do extinto Tuju, os valores dos pratos principais sempre foram de três dígitos —o que pode dar a falsa impressão de que a casa trabalha com margem folgada de lucro.

“Em restaurantes assim, um aumento de 10% nos alimentos significa não fazer dinheiro algum no fim do mês”, afirma.

A garoupa de cativeiro, que Ralston prepara na brasa e virou seu carro-chefe, já está custando R$ 80 o quilo e foi um dos ingredientes que mais aumentaram. Por isso, todo o cardápio subiu cerca de 10%, dois meses atrás, enquanto a garoupa passou de R$ 130 para R$ 170, um reajuste de pouco mais de 30%.

Mas susto mesmo devem tomar os clientes que procuram pela marmita #CPF, a Caixa Prato Feito, lançada pelo delivery da Casa do Porco em junho de 2020. Os seis itens, separados com capricho na embalagem, custavam R$ 48 pelo iFood na época do lançamento. Hoje, o preço é de R$ 81 —um aumento de quase 70%.

Procurado pela reportagem, o casal Jefferson e Janaína Rueda estava em Antuérpia, na Bélgica, onde recebeu o prêmio 50 Best como 17º melhor restaurante do mundo. Em nota, através da assessoria de imprensa, o casal justificou o aumento:

“A Casa do Porco sempre teve como princípio oferecer comida de qualidade por preços justos, levando assim a alta gastronomia caipira ao maior número de pessoas possível. Único restaurante brasileiro entre os 50 melhores do mundo, hoje oferece um menu-degustação de R$ 165, muito abaixo da média praticada por outros restaurantes, e não só na capital paulista, como em todo o país e até no mundo, se considerarmos que custa US$ 30. Ao lançar um novo conceito de delivery com o CPF, em junho de 2020, a ideia era levar parte da experiência da Casa do Porco para a casa dos paulistanos, de forma segura durante a pandemia. Deu certo e o serviço foi mantido após a retomada, com uma cozinha própria para atender à demanda. No entanto, de lá para cá, vimos a economia do país enfrentar sérios desafios, e os preços dos insumos e do combustível dispararem no último ano. Depois da crise sem precedentes que se abateu sobre o mundo e impactou especialmente o setor de alimentos e bebidas, infelizmente é inviável para qualquer negócio absorver totalmente estes custos e, por isso, o reajuste foi necessário.”

E a perspectiva não é de melhora. Embora analistas apostem em uma desaceleração da inflação, a perspectiva é de um IPCA ainda em nível alto nos próximos meses. O boletim Focus divulgado no início deste mês projeta uma inflação de 8,51% ao fim deste ano.