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Padaria solidária vende pães que padre Julio Lancellotti distribui para quem vive na rua

Criada na pandemia em SP, Pão do Povo da Rua usa o dinheiro para custear doações

Cozinheiro do projeto Pão do Povo da Rua, que agora abre padaria, cozinha na sede no Bom Retiro

Cozinheiro do projeto Pão do Povo da Rua, que agora abre padaria, cozinha na sede no Bom Retiro Ale Ruaro/Divulgação

São Paulo

Na estufa recém-instalada na porta de um galpão no Bom Retiro, no centro de São Paulo, pães e bolos fresquinhos são expostos. Os sabores são vários —milho, coco, malte, torresmo, banana, cenoura, laranja e fubá. Mas bem mais extensa é a produção que sai dos fornos, incompatível com a de uma padaria pequena normal da cidade.

Mas essa não é uma padoca comum. Do lado de dentro, 17 pessoas botam a mão na massa, literalmente, e dão conta de produzir cerca de 3.500 pães e mil bolinhos todos os dias. Nem tudo é reservado aos clientes que procuram presencialmente a vendinha do Pão do Povo da Rua, inaugurada há menos de um mês, nem aos pedidos que chegam para delivery,

A razão da grande produção é outra —garantir o café da manhã de cerca de 1.500 pessoas em situação de rua na capital. O projeto nasceu no ano passado, mas antes usava toda a força de trabalho para produzir comida e doá-la às pessoas sem casa espalhadas pelo centro de São Paulo. Agora, precisou apostar em uma nova forma de fechar as contas desde que as doações de dinheiro e insumo, que antes eram a única fonte de renda, despencaram nos últimos meses.

Cesta com produtos do Pão do Povo da Rua, que começou a ser vendida recentemente
Cesta com produtos do Pão do Povo da Rua, que começou a ser vendida recentemente - Ale Ruaro/Divulgação

“As pessoas acham que a pandemia está acabando e que a fome acaba junto. Mas ela só aumentou, é epidêmica. Muitos foram parar na rua por causa disso”, diz Ricardo Frugoli, professor, fundador do Instituto de Pesquisa da Cozinha e da Cultura Brasileiras e criador da iniciativa.

Foi assim que nasceu a nova padaria. Para dar o gás necessário nas vendas, o projeto aposta em seu carro-chefe —uma caixa de quitutes que custa R$ 90 e, ao ser comprada, garante a distribuição de 30 refeições para quem vive na rua. Em troca, o cliente leva para casa mais de dois quilos de produtos como pães, rosquinhas, broas e bolos.

“São sabores que lembram a infância e remetem à memória gustativa principalmente de quem nasceu em São Paulo. A rosca de torresmo, por exemplo, está em extinção e quis resgatá-la”, conta Frugoli. Além da cesta, também são vendidas nove das receitas distribuídas diariamente nas doações a quem não tem casa, como o Pão do Povo da Rua e o Pan Dulce, que saem por R$ 25 cada um.

Apesar da inauguração recente, a história teve início em março de 2020. Morador do centro, Frugoli decidiu começar a distribuir marmitas depois de notar que um dos efeitos da pandemia foi um aumento de pessoas em busca de comida no lixo.

A iniciativa cresceu e o instituto de Frugoli conseguiu entregar 20 mil refeições com o Marmita Solidária até outubro do ano passado, quando ele recebeu a doação de um forno e de outros equipamentos de uma padaria que havia fechado as portas. Sem lugar para guardá-los, o jeito foi usar a cozinha da Casa de Oração do Povo da Rua, oferecida pelo padre Julio Lancellotti. O local acabou batizando o Pão do Povo da Rua.

Frugoli, que nunca havia se aventurado como padeiro, deu início à empreitada com outras três pessoas que faziam cerca de 400 pães por dia. Poucos meses depois, a equipe já havia praticamente quadruplicado. A cozinha do padre Julio Lancellotti ficou pequena, e o grupo teve que migrar para o atual espaço de 500 metros quadrados no Bom Retiro.



No local, 14 pessoas que o projeto assistia nas ruas da cidade foram capacitadas por profissionais voluntários e agora recebem auxílio financeiro, alojamento e assistência jurídica e psicológica.
Somados à equipe, cerca de 90 voluntários se revezam todos os dias em uma kombi amarela e branca para distribuir dois pães, um bolinho e um chocolate quente para quem vive nas ruas.

Os pães são pensados para durar mais do que uma refeição. “O pão é semi-integral e quatro vezes mais nutritivo do que o francês. Como ele pode matar a fome de uma janta, tivemos o cuidado de fazer embalagens para que dure até sete dias”, explica Frugoli.

Para alcançar mais gente, a produção também é escoada por organizações como o Núcleo de Convivência São Martinho de Lima, do padre Julio Lancellotti, e a Associação Missionária Amigos da África.

Quatro dias por semana, outro braço do projeto, o Sopa e Pão, garante o jantar de mais pessoas. Às quartas, a chef Janaína Rueda, do Bar da Dona Onça, ocupa a cozinha para fazer seu cuscuz de galinha, também distribuído à noite.

Frugoli diz que, se o projeto conseguir se manter de pé, poderá não só bater a meta de 1 milhão de alimentos distribuídos até o fim do ano, mas também criar uma escola de gastronomia para a população de rua. “Temos capacidade para produzir muito mais, o que falta é insumo e recurso”, diz.

Pão do Povo da Rua
R. Dr. Pedro Arbues, 147, Bom Retiro. Pedidos: (11) 3313-1888 e (11) 99595-9962. Doações: Banco Santander; Instituto de Pesquisa da Cozinha e da Cultura Brasileira; ag. 1717; c/c. 13000787-2; CNPJ 31.721.081/0001-42 (também é o Pix). Inform.: ipcb.net.br, Instagram @paodopovodarua e @ipcbcozinhabrasileira

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