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Restaurantes

Nostalgia e marketing mudam a cara das culinárias regionais em São Paulo

Estabelecimentos paulistanos abraçam a regionalização com ingredientes e técnicas de outros estados para se diferenciar

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São Paulo

Percorrer a oferta da gastronomia nacional em São Paulo tem revelado uma mudança de perfil nos últimos anos. Impulsionados pela necessidade de diferenciação em um mercado competitivo e levados por uma nostalgia de experiências mais específicas, restaurantes da capital têm declarado a origem da sua culinária de forma mais direta.

Se antes era comum ver casas que afirmavam fazer comida nordestina ou comida do Norte, que já parecia indicar uma especialização suficiente, agora não mais. Por mais que sejam antigas as experiências de restaurantes batizados de consulados, como o mineiro e o baiano, mais estabelecimentos agora parecem variar e detalhar mais suas inspirações e revelar não só a riqueza das culinárias regionais, mas também suas nuances locais.

Arroz com nata e paçoca do restaurante Jesuíno Brilhante - Marcela Oliveira/Divulgação

O fenômeno não só enriquece a experiência gastronômica dos clientes, como também reafirma as identidades por meio da comida.

É assim que vemos ganhar espaço endereços como o Jesuíno Brilhante e o Cuscuz da Irina, que se apresentam como casas de gastronomia de influência não apenas nordestina, mas potiguar. Também acontece com o Quintal Paraense, que rompe a generalização de cozinha amazônica para apresentar uma culinária mais centrada em um estado específico.

Da mesma forma, o Tucupi do Centro busca se diferenciar com um tempero puramente acreano. O modelo é parecido ainda com o apresentado no Como, especializado na comida de Goiás, que tenta se diferenciar da tradição caipira mais associada à culinária de Minas Gerais.

A regionalização da cozinha brasileira está atrelada a uma série de fatores, entre eles a crescente valorização das identidades culturais locais, a busca por autenticidade e a própria curiosidade dos consumidores por novas experiências.

Se pelo lado dos clientes, a diferenciação é uma resposta ao crescente interesse por experiências gastronômicas mais "autênticas", para os restaurantes, a justificativa costuma se apegar à nostalgia dos chefs e cozinheiros.

Basta ver cardápios e redes sociais, onde proliferam as referências ao que se comia na infância e com a família, e a frustração de não se achar nada igual em São Paulo.

Costelinha de tambaqui servido no restaurante Tucupi do Centro - Reprodução

Isso tudo não permite ignorar a importância do marketing, que desempenha um papel crucial nesse fenômeno.

Segundo o sociólogo Carlos Alberto Dória, especialista em história e cultura da alimentação no país, essa diferenciação responde à necessidade de destacar os restaurantes no mercado. "O ambiente da restauração é muito competitivo, então é preciso construir uma singularidade a qualquer custo", diz Dória.

Ele argumenta que a ênfase na especificidade estadual, antes comum no turismo, agora está sendo adaptada para a alimentação.

O pesquisador questiona, entretanto, a busca pela autenticidade nesse processo, e alega que ela não respeita a verdadeira geografia culinária do Brasil. "Há manchas culinárias mais ou menos homogêneas no mapa, que não respeitam fronteiras estaduais. Há uma cozinha caipira, uma cozinha sertaneja e uma cozinha litorânea, por exemplo", explica.

Nesse sentido, a divisão estadual é artificial e não reflete a realidade das tradições alimentares, que transcendem as fronteiras políticas criadas por questões históricas e econômicas. Para ele, essa regionalização responde mais a uma demanda mercadológica do que a uma realidade.

"Reivindicar particularidades pernambucanas, baianas, paulistas, mineiras ou o que for, carece de sentido transcendente", afirma ele.

Sobre isso, ele cita o exemplo do cuscuz de milho, que está presente em todo o Nordeste, sem grandes diferenciações entre os estados. O sociólogo reconhece, ainda assim, que há espaço para um trabalho mais aprofundado de pesquisa sobre a verdadeira diversidade brasileira, destacando a importância de diferenciar o que é genuinamente local em termos naturais e culturais.

Independentemente da discussão sobre o que é autêntico ou não em cada estado, o movimento apela à nostalgia e ajuda a refletir melhor a pluralidade de culinárias do país. Ajuda, ainda, a explorar melhor a identidade, a história e a cultura do Brasil.

Jesuíno Brilhante
Comandado por Rodrigo Levino, é especializado em comida sertaneja potiguar. Prepara carne de sol na nata (R$ 45) e o baião da casa com charque (R$ 45).
R. Arruda Alvim, 187, Pinheiros, região oeste, tel. (11) 98754-1853, @jesuinobrilhante


Cuscuz da Irina
A chef Irina Cordeiro expede pratos nordestinos a partir de R$ 30, em especial com cuscuz.
R. Ipero, 47, Vila Madalena, região oeste, @cuscuzdairina


Quintal Paraense
Na cozinha de Karina Fonseca, do Pará, os destaques são o tacacá (R$ 46) e o filé de filhote frito (R$ 84). O local ainda oferece menu-degustação por R$ 249.
R. Horácio Vergueiro Rudge, 535, Casa Verde, região norte, @quintalparaense


Tucupi do Centro
De comida acreana, o restaurante da chef Amanda Vasconcelos tem no menu quiabo frito no missô e tucupi (R$ 18), carne de sol com macaxeira e feijão-verde (R$ 38) emoqueca amazônica (R$ 94).
Av. São Luís, 187, República, 1º andar, loja 1 e 2, região central, @tucupidocentro

Colaborou Francielle Souza