Saiba se é possível comprar meia-entrada para idosos em shows mesmo sendo estudante

Benefício para alunos some nas plateias de Demi Lovato e Rosalía, mas sobra para a terceira idade

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São Paulo

Na noite em que Rosalía fez seu show de estreia no Brasil, o estudante de ciências contábeis Fabrício Batista foi barrado na porta da casa de shows. O jovem de 26 anos não poderia passar pelos seguranças se não pagasse R$ 240. O motivo foi o tipo de bilhete comprado por ele: meia-entrada para idoso.

"Comprei porque não tinha a de estudante para vender. Nem a de PCD, a que sempre prefiro, porque é menos concorrida", diz o jovem, que tem uma deficiência auditiva e teria direito a meia-entrada por causa disso também. "No desespero, a gente compra a que tem, né? Ainda mais com um site instável."

Ingresso de show de musica aparece sendo rasgado ao meio por uma mulher ruiva
Catarina Pignato

O caso dele não é isolado. Diversos outros estudantes não encontraram meia-entrada para o mesmo show e optaram pelo benefício da terceira idade —e foram barrados pelos seguranças, que pediam comprovantes e documentos para as pessoas na fila.

"Mostrei que era estudante e que usava aparelho auditivo, mas nada. Cheguei a perguntar se devolveriam o meu dinheiro, mas disseram que não. Como eu não queria perder o show, acabei pagando a diferença", diz Batista.

O mesmo ocorreu com Letícia Alves, 23, estudante de relações internacionais na UFSC, a Universidade Federal de Santa Catarina. Ela viajou a São Paulo apenas para a apresentação da cantora e, por falta de meia-entrada para estudante, também comprou a opção para idosos. Com outros shows se aproximando, como do grupo RBD, a dúvida fica cada vez maior.

"Quando abriram as vendas, eu era uma das primeiras pessoas na fila virtual —mesmo assim, já apareceu esgotado. Gastei R$ 360 com a meia-entrada para idoso e depois mais R$ 360 para poder assistir", diz.

A estudante afirma que chegou a apresentar a carteirinha da UNE, exigida pela lei, mas ela diz que o fiscal ignorou o comprovante porque seu bilhete era para a terceira idade.

"Eu me senti lesada, porque tenho direito, mas o site não ofereceu a meia para estudante. Na hora eu nem tinha dinheiro, tive que pegar emprestado para conseguir entrar."

Relatos parecidos pipocaram pelas redes sociais. Não apenas no show de Rosalía, que se apresentou em São Paulo na noite de 22 de agosto, mas também em outras apresentações concorridas, como a de Demi Lovato, que esteve na capital paulista no fim de agosto, antes de tocar no Rock in Rio.

A lei 12.933/2013 garante que 40% dos bilhetes, incluindo os de camarotes e cadeiras especiais, sejam destinados a meias de estudantes, jovens de baixa renda, pessoas com deficiência e seus acompanhantes e idosos. No caso do estado de São Paulo, professores e auxiliares da rede estadual e municipal de ensino também têm direito ao benefício.

De acordo com Renata Reis, coordenadora das áreas técnicas do Procon-SP, porém, não existe justificativa para diferenciar as meias-entradas nas bilheterias. "A lei não divide percentuais para cada categoria. A empresa tem que vender de acordo com o fluxo de interesse. Os 40% são para todos", diz. Ou seja, se entradas para estudantes acabaram, mas sobraram as de idosos, por exemplo, esses benefícios podem ser remanejados para o grupo com mais procura.

"Eles não podem dizer que o ingresso é só para idosos se não houver ninguém desse grupo ali no momento para adquirir os bilhetes. É preciso deixar aberto para quem tem direito a meia-entrada."

Mesmo assim, a orientação dada pelo Procon é que o consumidor nunca compre ingressos de uma categoria diferente à sua —adquirir meia-entrada de idoso sendo estudante, por exemplo.

A orientação do órgão para o caso de a empresa alegar que a cota destinada à categoria do consumidor está esgotada, é que o consumidor solicite a comprovação dessa informação. Caso não receba uma resposta, ele pode então registrar reclamação nos órgãos de defesa do consumidor. Outra opção é adquirir a entrada inteira e posteriormente questionar a falta da meia-entrada junto aos órgãos de defesa do consumidor.

Estudante de gestão financeira, Stephanie Nascimento, 23, foi outra das fãs barradas na entrada do show de Demi Lovato. "Pretendo procurar a Justiça, porque foram R$ 360 que precisei pagar na hora. Só aceitei porque já estava na porta."

Mas nem sempre há mais meias-entradas para idosos do que para estudantes em shows. Em apresentações do cantor Roberto Carlos, por exemplo, a bilheteria virtual Eventim não disponibilizava nenhum benefício até o começo de setembro, inclusive para idosos, o que fez com que fosse registrada uma série de reclamações no portal Reclame Aqui.

A Eventim foi a responsável também pela venda dos shows de Demi Lovato e Rosalía. A empresa já havia sido alvo de investigações pelo Procon-SP por causa do esgotamento de entradas em tempo muito curto.

A cantora espanhola Rosalía durante show em São Paulo
A cantora espanhola Rosalía durante show em São Paulo - Adriano Vizoni/Folhapress

Em nota, a Ticket360 disse seguir a lei e destinar 40% dos ingressos de eventos a meia-entrada de pessoas com deficiência, estudantes e jovens baixa renda, com exceção de setores como camarotes. A empresa afirma que, nesses casos, a quantidade de benefícios disponibilizado pode ultrapassar a cota estipulada.

Para idosos, a bilheteria afirma seguir o Estatuto do Idoso e que mais benefícios para a terceira idade podem ser disponibilizados caso o limite de 40% das entradas seja atingido.

Após o contato da reportagem, as meias-entradas para idosos começaram a aparecer no site da Eventim para os próximos shows de Roberto Carlos. Procuradas desde o dia 5 de setembro, Eventim, Time 4 Fun e Sympla não responderam às perguntas enviadas.

Segundo Suzana Pimenta Catta Preta, ex-procuradora do estado de São Paulo e professora de direito do consumidor na PUC-SP, as bilheterias precisam ser transparentes em relação à quantidade de ingressos. "O certo seria o site ter uma espécie de placar de vendas, que mudaria de acordo com os ingressos que fossem vendidos. Não é possível dosar o grau de irregularidade se não houver transparência."

Apesar de ter pago a mais, Fabrício Oliveira diz que não se arrependeu de ter ido ao show de Rosalía. "A mami [como a espanhola é chamada pelos fãs] entregou demais."

Sou estudante, mas a meia-entrada de alunos está esgotada. Posso comprar meia de idoso?
O organizador deve disponibilizar 40% dos ingressos para quem tem direito a meia-entrada. A lei não faz divisão por categoria: são 40% de bilhetes reservados a todos os que têm esse direito. Na hora da compra, se um estudante só encontrar benefícios para idosos, por exemplo, ele pode reclamar. Nesses casos, a orientação do Procon é que seja feita uma denúncia antes de adquirir as entradas, para que o evento responda formalmente.

Comprei meia-entrada de idoso para um show futuro, mas sou estudante. E agora?
A principal orientação dada pelo Procon é para que o consumidor nunca adquira um ingresso diferente do da sua categoria —por exemplo, comprar meia-entrada de idoso sendo estudante. Caso a empresa alegue que a cota destinada à categoria do consumidor está esgotada, ele pode solicitar à empresa que comprove essa informação. Caso não obtenha resposta, a opção é registrar reclamação nos órgãos de defesa do consumidor. A outra opção é adquirir a entrada inteira e, posteriormente, questionar junto aos órgãos de defesa do consumidor.

Ainda assim, o Procon informa que a pessoa terá que assumir a diferença, caso compre um ingresso diferente de sua categoria.

Sou idoso e não encontrei nenhum tipo de meia-entrada que me contemple, o que fazer?
O ideal é também acionar o Procon para que a empresa mostre como foi o fluxo de vendas.

A empresa é obrigada a disponibilizar o total de ingressos disponíveis e quantos são meias-entradas?
Sim, elas precisam estar preparadas para apresentar o número total de ingressos, inclusive de meias-entradas, em todos os pontos de venda. Esse balanço deve ser disponibilizado ao público. Se o cliente pedir para a empresa, mas ela se recusar a responder, o Procon deve ser procurado.

Fonte: Renata Reis, coordenadora das áreas técnicas do Procon-SP

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Versão anterior deste texto afirmou incorretamente que é possível comprar ingresso de meia-entrada em uma categoria diferente da destinada ao beneficiário. O texto foi corrigido.

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