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Ainda muito incipiente, o cinema de Moçambique exibe vigor em “Comboio de Sal e Açúcar”. Festivais têm recebido bem o filme. Além da escolha como melhor longa pela crítica em Locarno, conquistou prêmios em mostras de países como EUA, Marrocos e Tunísia.
Dirigida por Licínio Azevedo, brasileiro que vive há mais de quatro décadas no país africano, a produção mobilizou equipes e investimentos de outros lugares, como Portugal, Brasil, França e África do Sul.
Apesar desse viés multinacional, “Comboio” é essencialmente um olhar moçambicano para a história recente da jovem nação.
Em 1977, dois anos depois de se tornar independente de Portugal, o país foi tomado por uma guerra civil. De um lado, o governo socialista conduzido pela Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo), do outro, a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo).
Pelo menos 1 milhão de pessoas morreram nessa guerra, que se estendeu até 1992.
É esse o contexto do filme, que acompanha um trem a cruzar áreas de conflito entre Nampula, cidade no norte de Moçambique, e o Maláui, país vizinho. Estão a bordo civis em fuga e militares.
“Comboio” concilia bem a tensão crescente ao longo da viagem e a exposição de traços da política, da economia e da cultura do país.
O medo e, mais adiante, a aflição dos passageiros trazem à tona manifestações de espiritualidade, que transitam entre o catolicismo, o islamismo e, sobretudo, as religiões locais.
Não há só agonia, porém. Em meio ao avanço do trem, surge um romance entre o tenente Taiar (Matamba Joaquim) e a enfermeira Rosa (Melanie de Vales).
São personagens de certa complexidade, o que não acontece com tipos como o sargento Salomão (Thiago Justino), um vilão cuja força se esvai no maniqueísmo. Não é um problema que leve o filme a desandar. “Comboio” compõe um retrato instigante de um país e de um cinema em formação.
No mais, existe o prazer de ouvir a língua portuguesa ao estilo moçambicano, com suas expressões próprias e um sotaque que se impõe a meio caminho entre as pronúncias de Portugal e do Brasil.
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