Mulheres quebram barreiras e ganham voz no sertanejo universitário

No top 10 das músicas mais tocadas nas rádios brasileiras em 2016, não houve espaço para outro gênero que não o sertanejo. Até aí, nenhuma novidade. Mas, se antes a lista era dominada por homens, no ano passado, as cantoras puxaram a fila: segundo a empresa de monitoramento de rádios Crowley, a segunda mais tocada no país foi "Infiel", de Marília Mendonça; a quinta, "Medo Bobo", de Maiara e Maraisa; e a oitava, "50 Reais", de Naiara Azevedo.

Marília, Maiara e Maraisa são as principais atrações da Festa das Patroas, que deve reunir até 30 mil fãs do estilo neste sábado (6), na arena do Anhembi. O ingresso para o show das sertanejas, que vem rodando o país, custa de R$ 150 a R$ 400.

Na plataforma de streaming Spotify, Maiara e Maraisa e Marília Mendonça também estão no ranking das cantoras mais ouvidas no país, atrás apenas de Rihanna. O hit "Loka", das irmãs Simone e Simaria com Anitta, é a décima na lista das 50 músicas mais tocadas no app nesta semana.

Juntas, essas artistas encabeçam o feminejo, uma nova cena de mulheres que não têm medo de dizer o que era dito apenas por homens. Em suas letras, falam sobre pegação, bebedeira, traição e amor, sempre sob o ponto de vista feminino.

A fórmula leva ao auge: além de bombarem no YouTube, as cantoras fazem até 28 shows por mês. Henrique e Juliano, uma das principais duplas masculinas atualmente, se apresentam 16 vezes, em média.

Mas, antes do sucesso, elas tiveram que superar o preconceito. "Ouvi que mulher no sertanejo não ia virar nada, que era pra eu desistir", conta Naiara Azevedo.

"As pessoas falavam que quem menstrua não faz sucesso", diz Maiara, da dupla com Maraisa. "Por isso, acho que o feminismo reflete o que a gente faz. Mostramos que também temos valor, que nosso cachê tem que ser o mesmo dos machos."

O "Guia" apresenta a seguir o trabalho e a agenda dos próximos shows de oito dessas mulheres –duas duplas e quatro cantoras.


Marília Mendonça

"O meu cupido é gari, só me traz lixo. Lixo, lixo, você é prova disso"
("Meu Cupido É Gari" - Marília Mendonça)

Quando gravou seu primeiro DVD, em 2015, Marília tinha 19 anos e cantou para 30 pessoas, em um estúdio. Pouco mais de um ano depois, em outubro de 2016, ela gravou o segundo álbum da carreira –desta vez, para 40 mil pessoas, no sambódromo de Manaus.

O sucesso de "Infiel" foi o responsável por essa evolução e por fazer com que a cantora de Cristianópolis (GO) ficasse conhecida no país, encabeçando o boom de mulheres que tomaram um espaço dominado por homens na música sertaneja. Antes do hit, Marília compunha desde os 12 anos e emplacara letras nas vozes de artistas consagrados, como Henrique e Juliano, Jorge e Mateus e Cristiano Araújo (1986-2015).

A cantora Marília Mendonça *** ****
A cantora Marília Mendonça *** **** - Artur Menine/TV Globo

"Tivemos coragem de falar de assuntos com os quais a mulher se identifica. Não adianta sofrer, ser traída ou trair e cantar sobre o príncipe encantado", afirma.

É essa mulher independente, que não tem medo de ficar sozinha, que protagoniza suas músicas. "A base do feminismo, de que a mulher pode ser o que ela quiser, é a bandeira que eu levanto."

AGENDA
6/5 - Festa das Patroas. Pq. Anhembi (São Paulo). Ingr.: ticket360.com.br
14/6 - Estância Alto da Serra (São Bernardo). Ingr.: ticket360.com.br 
28 e 29/7 - Citibank Hall (São Paulo). Ingr.: ticketsforfun.com.br 
6/9 - Rodeio (Itu). ​Ingr.: ticket360.com.br


Maiara e Maraisa

"Não sou do tipo que procura amante, mas aconteceu e foi interessante" 
("Melhor Terminar" - Maiara e Maraisa)

As gêmeas de 29 anos, nascidas em São José dos Quatro Marcos (MT), despontaram no final de 2015, quando gravaram o primeiro DVD. O hit "10%" (de "garçom, troca o DVD"), que fala sobre uma noite de bebedeira feminina, jogou os holofotes na dupla.

O sucesso ajudou a quebrar o preconceito e o machismo que marcaram o início da carreira. "Falavam que não teríamos fãs [mulheres], que elas iam aos shows só para ver os homens no palco", diz Maiara.

As gêmeas Maiara (à esq.) e Maraisa  *** ****
As gêmeas Maiara (à esq.) e Maraisa - Avener Prado/Folhapress

Nas músicas, algumas de autoria própria, elas assumem que gostam de beber, que vão ao motel e à balada. Também falam de amor, mas sempre no papel de protagonistas.

"Com o sucesso, os empresários passaram a procurar um produto feminino; isso mudou a visão do mercado", diz Maraisa.

AGENDA 
6/5 - Festa das Patroas. Pq. Anhembi (São Paulo). Ingr.: ticket360.com.br 
8/7 - Farraial Sertanejo (São Paulo). Ingr.: ticket360.com.br 
6/9 - Rodeio (Itu). Ingr.: ticket360.com.br


Naiara Azevedo

"Que bonito, hein! Que cena mais linda, será que eu estou atrapalhando o casalzinho aí?" 
("50 Reais" - Naiara Azevedo)

Depois de ouvir "Sou Foda", hit um quê machista de 2011 de Carlos & Jader, a cantora de Farol (PR) resolveu escrever uma música que representasse a perspectiva feminina.

"Achei muita prepotência falar da mulher como um objeto. As pessoas precisam ouvir o nosso lado", diz. Da ideia surgiu "Coitado", resposta em que ela "defendeu a mulherada".

Nesse começo de carreira, ela diz ter sofrido preconceito, "porque era gorda e porque sou mulher".

A paranaense Naiara Azevedo ***  ****
A paranaense Naiara Azevedo - Divulgação

Ainda assim, vieram hits como "50 Reais" –baseado, em partes, em um antigo relacionamento.

Naiara busca inspiração também em outras artistas. "Vejo um pouco do que quero ser nas performances de Beyoncé, na forma de cantar de Adele e na força de Ivete Sangalo."

AGENDA 
20/5 - Gran São João (Limeira). Ingr.: tkingressos.com.br


Simone e Simaria

"E agora ele bate, bate nela. E ela chora querendo voltar pros braços de sua mãe" 
("Ele Bate Nela!" - Simone e Simaria)

As irmãs de Uibaí (BA) começaram a cantar ainda crianças: aos 14 anos, Simaria já fazia backing vocal na banda de Frank Aguiar –Simone se juntaria a ela depois e as duas trabalharam com ele por sete anos.

Mais tarde, integraram o grupo Forró do Muído, popular no Nordeste. "O Forró foi quem nos abriu as portas, mas crescemos ouvindo e cantando sertanejo", diz Simone.

As irmãs Simone e Simaria (à frente)  *** ****
As irmãs Simone e Simaria (à frente) - Ramón Vasconcelos/TV Globo

A carreira independente começou em 2012. Em 2015, lançaram o DVD "Bar das Coleguinhas" e, desde então, despontaram. "O público está aplaudindo as mulheres no cenário, e posso dizer que isso não é moda, não. Veio para ficar", afirma a cantora.

AGENDA
2/6 - Citibank Hall (São Paulo). Ingr.: ticketsforfun.com.br


Paula Mattos

"Insegurança e uísque é ruim de combinar. Vamos embora, amor, depois da briga é mais gostoso o calor" 
("Chute e Bomba" - Paula Mattos)

"Tenho certeza de que a mulherada veio para ficar. Mas olha que não foi fácil chegar até aqui", diz a cantora e compositora.

Natural de Campo Grande (MS), ela começou a carreira como backing vocal da dupla Thaeme & Thiago. Dali, conheceu outros nomes, como a dupla Henrique e Juliano, e emplacou algumas composições, caso de "Que Sorte a Nossa" (gravada por Matheus & Kauan e por ela).

"Do que produzo, 80% tem influência de histórias e fatos que aconteceram comigo", diz.

A sertaneja Paula Mattos *** ****
A sertaneja Paula Mattos - Divulgação

Em 2015, Paula se lançou na carreira solo e gravou o primeiro álbum, "Acústico".

Hoje, é uma das promessas do feminejo, com mais hits, como "Rosa Amarela" e um DVD, gravado em SP em 2016. Nesta sexta (5), ela lança o clipe de "Amiga", com Marília Mendonça.

AGENDA
6/5 - Festa das Patroas. Pq. Anhembi (São Paulo). Ingr.: ticket360.com.br


Fernanda Costa

"Chame o juiz, eu vou passar minha felicidade pro seu nome. E nunca mais quero ouvir da sua boca a palavra some, só some" 
("Chame o Juiz" - Fernanda Costa)

A paraense de 32 anos, nascida em Tucuruí, começou a cantar ainda criança e vive da música desde os 16, se apresentando em hotéis e bares. Em 2010, Fernanda sofreu um acidente de carro que quase a fez desistir da carreira: uma fratura no fêmur a deixou por cinco meses na cadeira de rodas e mais cinco anos andando de muletas.

O dono de um hotel de Caldas Novas (GO), que conhecia sua voz, insistiu para ela continuar cantando –e lá ela foi descoberta por Bruno, da dupla com Marrone, que a apadrinhou.

No final de 2016, Fernanda gravou seu primeiro DVD, "Tempo Contado", lançado em São Paulo em março. A música de trabalho, "Chame o Juiz", tem mais de 7 milhões de visualizações no YouTube.

Hoje, tem os mesmos agentes que Marília Mendonça e Maiara e Maraisa. E diz chegar à cena para somar. "O feminejo é um alto-falante das mulheres, uma forma de colocar para fora tudo o que passamos."


OUTRAS VOZES
Mais cantoras que ajudaram a abrir espaço para a mulher na cena sertaneja

Roberta Miranda 
A "rainha sertaneja" inspira grande parte da nova geração. Estourou na década de 1990, com composições como "Majestade, o Sabiá", e vendeu quase 20 milhões de discos ao longo da carreira

Sula Miranda
Ficou conhecida como "rainha dos caminhoneiros" ao apresentar um programa na TV Record. Despontou no final da década de 1980, quando lançou seu primeiro disco solo, e chegou a fazer 25 shows por mês

Paula Fernandes 
A cantora iniciou a carreira em 1993, mas foi em 2009, com o álbum "Pássaro de Fogo", que alcançou a fama. Em 2016, ganhou o Grammy Latino de melhor álbum do gênero

Thaeme & Thiago e Maria Cecília & Rodolfo
As duplas lideradas por mulheres despontaram nos anos 2000, apadrinhadas por Fernando e Sorocaba e Jorge e Mateus. "Ai que Dó" e "Você de Volta" são alguns sucessos 


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