A história é real: Molly Bloom foi uma esquiadora que, prestes a se classificar para os Jogos Olímpicos, sofreu um acidente por conta de um graveto esquecido na pista de gelo. Após desistir do esporte e trocar o Colorado pela Califórnia, se tornou a "princesa do pôquer".
Bloom se transformou numa empresária que reunia apostadores profissionais, bilionários e celebridades de Hollywood ao redor de uma das mesas de pôquer mais exclusivas do mundo.
Rapidamente, ela virou uma lenda e os negócios foram bem por certo tempo, até a máfia russa e o FBI se interessarem por ela.
A aventura rendeu um livro autobiográfico, que Aaron Sorkin decidiu levar às telas, com Jessica Chastain no papel principal.
No filme, enquanto a empreitada dá certo, Bloom exercita toda a atenção aos detalhes que o esporte de alto rendimento exigira dela.
Três tempos narrativos se entremeiam. O primeiro é o dos flashbacks da infância/adolescência de Molly, quando seu pai (Kevin Costner) a submetia a uma disciplina de ferro para se aperfeiçoar no esqui. O segundo é o relato sobre como ela montou todo seu esquema de jogatina clandestina em quartos de hotel de luxo. O terceiro corresponde ao momento em que ela, com o advogado de defesa, interpretado por Idris Elba, enfrenta as acusações do FBI.
Há, contudo, algo de vertiginoso e confuso. A voz de Molly vai induzindo a narrativa a saltar de um estrato temporal a outro com aceleração anfetamínica, um pouco na linha que Scorsese costurou com maestria em "Cassino" e depois revisitou, já sem o mesmo êxito, em "O Lobo de Wall Street".
Sobra pouco tempo para o intrigante teatro de olhares da mesa de pôquer ou as interações mais nuançadas entre os personagens. Entre uma cena veloz e outra, grandes blocos de diálogo se impõem. Algumas trocas verbais são metralhadas, com réplicas e tréplicas se amontoando. Não é a verborragia inteligente das comédias românticas de tribunal dos anos 1940: está mais para os diálogos disruptivos de "A Rede Social" (de que Sorkin é roteirista).
A parte psicanalítica da trama é rasa, resume-se a um conflito edipiano tirado de alguma má receita de drama familiar. Mas a moral da história é questionar, de modo pertinente, as regras do jogo. Molly opera fora da lei, mas não abre mão de sua convicção ética. Quando se permite que o capital financeiro opere dentro da lei, mas fora da ética, como fica o jogo de Molly?
Se Sidney Lumet estivesse vivo, desconfio de que um grande filme sobre a mesma personagem pudesse sair de suas mãos.
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