Impossível assistir a “Uma Noite Não É Nada”, quinto longa de Alain Fresnot, sem se lembrar de “Lolita”. A história de um professor de meia-idade que se apaixona por uma aluna é construída em torno de inadequações e da crença no elixir da juventude, embora as ambições de Fresnot sejam muito mais modestas que as do romance de Nabokov e as do filme de Stanley Kubrick.
O trabalho desestimulante, o casamento empurrado com a barriga e um país sem futuro compõem o contexto no qual Agostinho sente despertar o desejo que parecia morto. Márcia, sua aluna num curso supletivo, representa a juventude sem rumo, com pais ausentes e que se refugia nas drogas.
São personagens perdedores e depressivos, sinais de uma época, os anos 1980, não muito diferentes da nossa. A fotografia monocromática, a trilha melancólica e a cenografia feita de espaços estreitos completam a impressão de um tempo sem vida e sem saída.
O desejo de Agostinho mais parece sofreguidão. Márcia, por sua vez, seduz e recua, repele o assédio, mas pede ajuda.
A personagem é instável, mas não tem as atitudes da mulher fatal fria e manipuladora. Ela é um pouco a Lola Lola de “O Anjo Azul” (1930) ou a Lulu de “A Caixa de Pandora” (1929). Nem precisa agir como perversa, pois o homem se afunda sozinho.
Márcia, no entanto, é uma personagem fugidia e impalpável e a imagem pálida de Luiza Braga colabora para fazer da personagem um fantasma. Por sua vez, a mulher de Agostinho, Januária, é a clássica “do lar” e só ganha presença durante o processo de autodestruição do marido.
Tanta centralidade do ponto de vista masculino e impositivo afeta o longa, bloqueando a existência dos outros personagens, sempre submetidos às vontades de Agostinho.
Quando a tragédia se abate e leva consigo o suposto poderio do protagonista, o filme escorrega para o melodrama oco.
Nesse ponto já não adianta apelar para o sentimentalismo, pois o maior problema de “Uma Noite Não É Nada” é apostar tudo em um personagem que não tem nada para gerar empatia.
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