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Cinema

Filme 'A Noite Devorou o Mundo' usa zumbis para falar de liberdade, solidão e delírio

Longa de Dominique Rocher desvia da estética de videogame e prioriza conflito de personagem

São Paulo

A Noite Devorou o Mundo (La Nuit a Dévoré le Monde)

  • Classificação 16 anos
  • Elenco Anders Danielsen Lie, Golshifteh Farahani e Denis Lavant
  • Produção França, 2018. 93 min
  • Direção Dominique Rocher

Veja salas e horários de exibição.

Estreante em longas-metragens, Dominique Rocher dirige “A Noite Devorou o Mundo”. O filme é uma adaptação livre do romance de Pit Agarmen (anagrama de Martin Page).

Embarcamos pela milésima vez no mito dos zumbis. “A Noite dos Mortos-Vivos” (1968), de George Romero, fez sucesso no auge da contracultura americana.

O videoclipe de “Thriller”, de Michael Jackson, completa 35 anos em 2018 e causou furor com a estética “zombie”. A série “The Walking Dead” é mera replicação de um fenômeno que envolve antropologia, religião e por aí afora.

​Sam (Anders Danielsen Lie) vai ao apartamento da ex-namorada para buscar sua memorabilia pessoal. A namorada está dando uma festa. Sam dorme. Ao acordar, descobre que o apartamento foi tomado por mortos-vivos. E, até onde a vista alcança, Paris também.

Os zumbis são meros subterfúgios. O que está em jogo são questões como liberdade, solidão e delírio. Até que ponto faz sentido viver trancafiado, esgueirando-se das ameaças, em uma cidade tomada por sangue e detritos.

Sam raciona comida, organiza armas. Tudo isso no corpo de um rapaz franzino, com cara de uma das primeiras vítimas dos slashers à moda de “Sexta-Feira 13”.

Dramaturgicamente, o roteiro quebra o arco esperado para um herói. Não temos a macheza de Clint Eastwood ou de Jean Gabin. Sam toca bateria, ouve heavy metal às vezes. Como um menino mimado, em desespero.

Apesar desse extremo sonoro, o filme traz um elemento importante: o silêncio. Não vemos a mão pesada do diretor, atormentando o público com excesso de barulho. Por igual motivo, há cautela nos efeitos especiais.

O fogo crepita na lareira. Sam começa rituais neuróticos relacionados à infância dos anos 80, suporte criativo típico da produção atual. “Stranger Things” e os irmãos Duffer que o digam. Temas interessantes pululam. Descartar corpos ou realizar funeral. A convivência com um animalesco morto-vivo, metáfora para o lado obscuro, à espreita do protagonista. 

Bela obra de Dominique Rocher, que desviou da estética de videogame e priorizou o conflito interno de Sam. Alguém que busca fazer o mais simples e o mais difícil: existir.

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