"Luthi, desculpe o nosso beijo na boca que não rola. Você põe a língua, a língua prende, porque tá seca a minha boca." No camarim, a atriz Maria Alice Vergueiro comenta com o colega Luciano Chirolli uma cena de "As Três Velhas", peça de Alejandro Jodorowsky que ela dirigiu em 2010.
A intérprete, hoje com 81, é tema "Górgona", documentário de Fábio Furtado e Pedro Jezler. Gravado ao longo de quase cinco anos, o filme registra a atriz e seus colegas nos bastidores da montagem.
Furtado, integrante do Pândega, grupo de Maria Alice, começou a filmar o elenco como experimento e se interessou pelo olhar da octogenária diante da câmera.
No filme, não há entrevistas ou imagens de arquivo. Mostra apenas os camarins, as coxias e os ensaios, "para dar uma perspectiva de quem faz o teatro", conta Furtado. A iluminação é balanceada segundo a luz do palco e cria certo estranhamento (proposital) nos registros fora de cena.
Como um observador, a câmera segue o elenco e registra Maria Alice, diagnosticada há mais de dez anos com mal de Parkinson, falando sobre a velhice e a falta de memória. Também acompanha os planos de acordo com a visão da atriz, que se locomove com uma cadeira de rodas devido a uma artrose nos joelhos.
É engraçada em seu despojamento e tem uma sinceridade crua. Fala abertamente sobre as dificuldades financeiras, como conta os centavos para pagar a equipe da peça.
Em certo momento, pede que escrevam ao autor, a quem devem dinheiro pelos direitos da obra: "Um dia pagaremos. Não digo quando, porque não somos profetas".
Maria Alice é mesmo górgona, daqueles seres que comovem e petrificam.
GÓRGONA
DIREÇÃO Fábio Furtado e Pedro Jezler
PRODUÇÃO Brasil, 2016, 14 anos
QUANDO sex. (21), às 20h, no Espaço Itaú de Cinema - Augusta; sáb. (22), às 17h40, no Espaço Itaú de Cinema - Frei Caneca; seg. (31), às 16h20, no Cine Caixa Belas Artes
20h24
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