É quase impossível não se sentir constrangido ao ver Thor montar no seu machado e flutuar como se fosse uma bruxa numa vassoura. O sentimento de vergonha alheia aumenta ainda mais quando, durante uma pancadaria, ele abre um espacate no ar para impedir o voo de duas naves.
Exibidas no começo do filme "Thor: Amor e Trovão", que estreia nesta quinta (7) nos cinemas, as duas cenas servem para cravar uma mudança: o super-herói, que deveria parecer um guerreiro nórdico malvadão, virou uma espécie de bobo da corte da Marvel nos cinemas.
É fácil perceber isso pondo todos os filmes do personagem lado a lado —no fim deste texto, saiba como assistir às produções nos cinemas e no streaming.
No novo longa, Thor precisa viajar pelo espaço para enfrentar o vilão Gorr, que quer destruir os deuses do universo. Para isso, ele recruta os amigos Valquíria e Korg, mas se surpreende com a aparição de Jane Foster, sua ex-namorada, agora musculosa e com poderes semelhantes aos seus.
Não demora para que o humor pastelão da história tome conta. Nos primeiros minutos, Korg narra um resuminho da vida do Thor como se estivesse lendo um conto infantil e, para ilustrar as antigas paixões do herói, é exibida uma sequência recheada de encenações caricatas, que poderiam ter saído de uma peça teatral de escola. O resultado é cafona.
O longa continua tentando tirar o peso das cenas que pedem seriedade. Exemplo é quando Foster, que descobre ter câncer, faz uma piadinha com filmes de ficção científica enquanto espera no hospital —o que só transparece o mau gosto do roteiro.
Isso sem falar de um Zeus de saia branca, de alienígenas que mais parecem o Mau de "Castelo Rá-Tim-Bum" e de vilões sendo destruídos por um ursinho de pelúcia.
Quem vem transformando os filmes do Thor numa comédia pastelona é o cineasta Taika Waititi, que dirigiu os dois últimos longas do super-herói. Mas é curioso pensar que o cenário era bem diferente quando o deus do trovão ganhou seu primeiro filme solo, em 2011.
Thor surgiu nas telas como um príncipe mimado que era cego pela vontade de se provar um bom rei. Com uma trama batida, já não era fácil gostar dele numa época em que a Marvel tinha outros heróis mais carismáticos —vale lembrar que a produção estreou no mesmo ano de "Homem de Ferro 2" e um ano antes de "Os Vingadores".
"Thor: O Mundo Sombrio", a sequência lançada em 2013, voltou ao universo nórdico com um roteiro genérico e cenas de ação pouco inspiradas —mas, em compensação, com o carisma de Tom Hiddleston no papel de Loki, ponto alto do filme.
É nesse momento que o personagem principal deixa de ser um príncipe mimado para se tornar um apaixonado sem sal. O roteiro faz malabarismos para destacar Jane Foster, a cientista humana vivida por Natalie Portman, por quem o fortão cai pelas tabelas.
Mal recebido pela crítica, o título mostrou para a Marvel que Thor estava num beco sem saída. Decidida a fazer uma reforma no personagem, a empresa ofereceu a cadeira de diretor do terceiro capítulo para Waititi, de "Jojo Rabbit" e "O que Fazemos nas Sombras".
O cineasta pôs sua marca em "Thor: Ragnarok", de 2017, que chegou às telas com uma estética colorida e roteiro engraçadinho que pouco dialoga com a história do deus do trovão.
O problema não é o humor, mas a falta de calibragem desse ingrediente. O personagem faz gracinha quando está acorrentado por um vilão gigantesco, dialoga como um adolescente e usa apelidos como "playboyzinho" para destravar um comando de voz enquanto tenta fugir de um planeta.
Resta saber se "Amor e Trovão" vai decretar o fim do personagem nas telas –mas, se o filme for bem de bilheteria, é bem provável que a versão engraçadinha do super-herói ganhe mais um capítulo. A verdade é que, nesse caso, quem rir por último dificilmente vai rir melhor.
COMO VER OS FILMES DE THOR
Thor: Amor e Trovão
Gorr era um adorador dos deuses até sofrer uma decepção com um deles —aí ele decidir que vai matar quantas divindades conseguir. Thor precisa reunir uma equipe para combater a ameaça do vilão, incluindo sua ex-namorada Jane Foster, que ganha poderes semelhantes ao do herói e vira a Poderosa Thor.
Austrália e EUA, 2022. Direção: Taika Waititi. Com: Christian Bale, Chris Hemsworth e Natalie Portman. Estreia nesta quinta (7) nos cinemas
Thor: Ragnarok
Hela, uma irmã maligna de Thor, quer dominar o reino de Asgard. O herói acaba sendo sequestrado e levado para um planeta onde é obrigado a participar de uma competição de luta. Para sair de lá, ele vai precisar vencer um combate contra um velho amigo.
Austrália e EUA, 2017. Direção: Taika Waititi. Com: Cate Blanchett, Chris Hemsworth e Tom Hiddleston. 12 anos. No Disney+
Thor: O Mundo Sombrio
O personagem precisa da ajuda de Loki para salvar o universo de Malekith, um elfo que deseja encontrar uma substância com grande poder destrutivo. O problema aumenta quando Jane Foster, o par romântico do Deus do Trovão, vira alvo do vilão.
EUA, 2013. Direção: Alan Taylor. Com: Chris Hemsworth, Natalie Portman e Tom Hiddleston. 10 anos. No Disney+
Thor
Depois de desobedecer a uma ordem do seu pai e rei, Thor é enviado à Terra como punição. Enquanto Loki, seu irmão adotivo, tenta tomar o trono, o herói recorre à ajuda da cientista humana Jane Foster para resgatar um poderoso martelo e voltar para seu lar.
EUA, 2011. Direção: Kenneth Branagh. Com: Anthony Hopkins, Chris Hemsworth e Natalie Portman. 10 anos. No Disney+
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