Conheça as casas de shows com melhor programação de São Paulo

Com radar aguçado, casas como Sesc Pompeia celebram diferentes estilos musicais

São Paulo
A cantora Vanessa Moreno e o pianista Salomão Soares na Casa de Francisca - Keiny Andrade/Folhapress

CASA DE FRANCISCA
Até 500 pessoas

Lucas Brêda

Não é exagero dizer que boa parte da elite da música brasileira passou pela Casa de Francisca. O pequeno palco, na esquina do Palacete Teresa, não comporta gigantes do streaming nem titãs da MPB, mas já recebeu gente que definiu estilos, artistas incensados pela crítica e alguns dos mais criativos nomes da cena contemporânea.

Voz transcendente da MPB e ícone tropicalista, Gal Costa, morta no fim do ano passado, chegou a cantar na Casa de Francisca. Não foi num dia comum da programação regular do espaço, mas na gravação de uma live na pandemia, destacando a arquitetura do palacete em vídeo. Zeca Pagodinho também gravou lá.

Mas se essas presenças se deram em circunstâncias incomuns, elas de certa forma são símbolo do que costuma dar o tom na Casa de Francisca —que destaca a música autoral e os ritmos brasileiros. Há espaço para nomes em ascensão e veteranos, quem desponta na cena de São Paulo e quem chama a atenção no Norte, além de shows íntimos de músicos acostumados a se apresentar para multidões.

No samba, já passaram pela casa nomes que compõem a realeza do gênero, como Nelson Sargento, compositores renomados como Nei Lopes, vozes esquecidas, como Geovana, gente da nova geração, como Douglas Germano, além de Fabiana Cozza e Alaíde Costa, entre outros. Ícone da ciranda pernambucana, Lia de Itamaracá costuma dar as caras no espaço, enquanto Manoel Cordeiro leva a guitarrada paraense.

Lenda da bossa nova, o pianista João Donato já se apresentou na Casa de Francisca sozinho e em sua parceria com Jards Macalé. A lista de gente que já cantou por lá vai de Siba a Linn da Quebrada, passando por Arrigo Barnabé, Mestrinho, Mateus Aleluia, Mônica Salmaso, Rodrigo Ogi, Chico César, Otto, Curumin, Bem Gil e Moreno Veloso.

Mas talvez o que melhor represente a programação seja o espaço dado a uma cena de música brasileira um tanto torta e inquieta: o grupo de músicos que são informalmente conhecidos como o Clube da Encruza —alcunha que eles mesmos assumem.

Entre eles estão os integrantes das bandas Metá Metá e Passo Torto, também com suas carreiras solo, como Juçara Marçal, Kiko Dinucci e Thiago França, além de Rômulo Fróes, Marcelo Cabral e Rodrigo Campos. Presenças constantes no espaço, são quase sócios da casa antes mesmo de ela se mudar para o atual endereço, em 2017.

Assim, a Casa de Francisca consegue se equilibrar entre oferecer um cardápio de atrações de apelo nacional, mas também fomentar uma cena local que se retroalimenta e se mantém viva. Acaba sendo uma via de mão dupla, em que a casa prestigia os artistas, que trazem prestígio a ela em um ciclo virtuoso.

Casa de Francisca - R. Quintino Bocaiúva, 22, Sé, região central. Instagram @casadefrancisca. Programação em casadefrancisca.art.br/novo/programacao


SESC POMPEIA
De 500 a 2.000 pessoas

Laura Lewer e Mariana Marinho

Uma ruazinha de paralelepípedos separa os dois lados da construção de tijolos aparentes que abrigou fábricas de tambores e geladeiras na década de 1940 e que, anos depois, nas mãos da arquiteta ítalo-brasileira Lina Bo Bardi, virou matéria-prima para a criação do Sesc Pompeia, inaugurado em 1982 na região oeste de São Paulo.

À esquerda de quem chega ao complexo está a comedoria, uma espécie de galpão que sedia shows para até 800 pessoas distribuídas em mesinhas e em pé. Do lado oposto e mais à frente, acessa-se o teatro, cujo palco pode ser rodeado por até 746 pessoas.

São formatos distintos que acabam por se completar. A comedoria garante a informalidade da apresentação com um público que circula solto com chopes e taças de vinho nas mãos, num formato mais típico de casas de shows.

Show da banda uruguaia No Te Va Gustar, na comedoria do Sesc Pompeia - Keiny Andrade/Folhapress

No teatro, por outro lado, as famosas cadeirinhas de madeira, praticamente coladas umas às outras, e o palco baixo —as primeiras fileiras ficam quase na altura dele— diminuem a distância entre artista e público e aumentam o intimismo. Ao mesmo tempo, o palco centralizado, cercado por duas plateias viradas uma para a outra e por galerias superiores, como numa arena, mantém a reverência ao que se vê ali quando as luzes diminuem.

Acolhendo seu passado industrial e negando os enquadramentos habituais da arquitetura da época, o Sesc Pompeia se tornou um dos principais espaços de cultura e lazer da capital paulista —e isso se traduz, principalmente, em sua programação musical, eleita a mais forte dentre as casas de show com capacidade de 500 a 2.000 pessoas em São Paulo ao lado do Cine Joia.

Desde seu primeiro ano, quando recebeu O Começo do Fim do Mundo, festival punk considerado um dos marcos do movimento no país, até os dias atuais, a curadoria da unidade soube manter seu radar aguçado para nomes em ascensão na música nacional. O espaço também traz para o Brasil artistas internacionais, que, não fossem os palcos do Sesc, dificilmente tocariam por preços tão amigáveis em um país estrangeiro.

Diferentes gêneros, sonoridades e territorialidades têm espaço ali. Vasculhando a programação, é possível encontrar lançamentos e shows comemorativos, apresentações de obras inéditas criadas a partir de sugestões do próprio corpo técnico da empresa —que mantém um selo musical—, encontros familiares ou entre gerações, homenagens e festivais que abraçam do jazz à música experimental.
Na prática, o local foi um dos primeiros palcos de nomes fundamentais para a música brasileira, como Arrigo Barnabé, Itamar Assumpção e Titãs, por exemplo.

Entre os artistas internacionais que já passaram pelos espaços da casa estão The Sun Ra Arkestra, Slum Village, Kamasi Washington e Patti Smith —que não chegou a cantar, mas lançou um livro no teatro em 2019 com ingressos distribuídos gratuitamente. Só em 2022, os palcos da rua Clélia receberam cerca de 64 mil pessoas em mais de 200 apresentações.

Entre estreias e despedidas —como o último show de Mamão, lendário baterista da banda Azymuth, que tocou ao lado de Marcos Valle no festival Zunido um mês antes de sua morte, em março deste ano—, a sensação é a de que a curadoria da unidade extrapola a apresentação e tem um claro cuidado com a forma com que a música será percebida naqueles espaços. O resultado são shows que ficam estampados na memória do público, indissociáveis dos locais onde aconteceram.

Sesc Pompeia - R. Clélia, 93, Água Branca, zona oeste. Instagram @sescpompeia. Programação em sescsp.org.br/unidades/pompeia


CINE JOIA
De 500 a 2.000 pessoas

Laura Lewer

Muita coisa já foi vista no prédio que ocupa o número 82 da praça Carlos Gomes. No início, na década de 1950, os olhos de quem frequentava o local ficavam vidrados em filmes dedicados à comunidade oriental da Liberdade, bairro onde ele foi construído. Depois assistiram a filmes de monstros, produções de pornochanchada e pornô e, por último, a pastores de uma igreja pentecostal.

Foi só em 2011 que, nas mãos de Facundo Guerra e Lucio Ribeiro —importantes nomes da noite e da cena musical paulistana—, o espaço trocou filmes e cultos pela música e se tornou o Cine Joia, que, ao lado do Sesc Pompeia, teve sua programação musical eleita como a melhor entre espaços que recebem de 500 a 2.000 pessoas em São Paulo.

O lugar, tombado como patrimônio histórico em 2018 e com a arquitetura original preservada, é queridinho entre os fãs de música brasileira e internacional, e, embora sofra críticas frequentes em relação à qualidade do som, também se destaca em outras frentes.

O piso inclinado e o palco baixo, por exemplo, formam um bom combo para os apreciadores de música, que conseguem ver bem a partir de qualquer ponto da casa e, ainda que estejam no fundo, não ficam muito distantes do artista que se apresenta.

Soma-se a isso a curadoria do espaço, pautada mais em cenas musicais em construção do que em estilos específicos. Por ali já passaram internacionais como Peter Hook —co-fundador do New Order e do Joy Division—, Lianne La Havas, Tame Impala e BadBadNotGood. A casa ainda tem uma parceria longeva com o Lollapalooza e já sediou várias das apresentações paralelas ao evento —nessa toada, já tocaram por lá Turnstile, Anderson Paak e Mika.

Com seleção que abraça indie, rap, jazz, MPB e rock, a reputação do Joia faz dele um espaço definitivo para impulsionar nomes emergentes e movimentar culturalmente uma cidade com poucos palcos que atendam tanto a artistas menores quanto os capazes de ocupar espaços bem maiores que aquele.

Cine Joia - Pça. Carlos Gomes, 82, Liberdade, região central. Instagram @cine_joia. Programação em cinejoia.byinti.com


ESPAÇO UNIMED
De 2.000 a 10 mil pessoas

Laura Lewer

É difícil a competição entre os grandes, mas o Espaço Unimed, antigo Espaço das Américas, casa paulistana que abriga até 8.000 pessoas em suas noites de shows, faz bonito quando o assunto é sua curadoria musical.

O espaço na Barra Funda, inaugurado em 2002, ano em que também foi criada a casa irmã Villa Country —ambas pertencem ao mesmo grupo, que também inclui a Audio— sai na frente das concorrentes usando como trunfo a versatilidade que seu tamanho garante.

Por lá, passa um balanço quase sempre fino entre o que agradaria a um jovem atento ao que há de mais novo na música internacional, a uma pessoa afeita a sons com menos firulas e a um fã fiel, que ama assistir quase que anualmente a uma atração a qual escuta há muito tempo.

Com poucas semanas de diferença, por exemplo, a casa pode receber seu público para dançar ao som da nova turnê de Djavan ou da dobradinha entre Alexandre Pires e Seu Jorge, ver a despedida dos palcos da americana Dionne Warwick, passar o Dia dos Namorados na companhia de Anavitória e celebrar as carreiras de Ney Matogrosso ou Chitãozinho e Xororó, seminais em seus campos musicais. Há quem não goste de um nome ou outro, mas a relevância costuma ser inegável.

Desde que abriu as portas, o Espaço Unimed recebeu em seu palco turnês de gigantes como Lauryn Hill, Morrissey, Erykah Badu e Robert Plant, pioneiros como os gigantes do rap Wu Tang-Clan e artistas incensados, como a espanhola Rosalía, que fez seu primeiro show no Brasil na casa, em 2022, e Maneskin, que tem apresentação agendada para o fim deste ano.

O local ainda é palco frequente de nomes brasileiros essenciais —Roberto Carlos, Gal Costa, Maria Bethânia, Caetano Veloso, Paulinho da Viola, Planet Hemp, Os Paralamas do Sucesso e Gilberto Gil são alguns dos que pisaram mais de uma vez por lá.

Sem deixar de lado a escalação de integrantes mais recentes da música nacional, como Criolo, Ludmilla, Tim Bernardes e Emicida, o espaço foi eleito como a melhor programação entre as casas de show que recebem de 2.000 a 10 mil pessoas na capital paulista.

Espaço Unimed - R. Tagipuru, 795, Barra Funda, zona oeste. Instagram @espacounimed. Programação em espacounimed.com.br

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