Diretor de "Boca do Lixo" anuncia parceria com rei da pornochanchada

Foi numa esquina da rua Triunfo com rua Vitória, centro de São Paulo, que a Boca do Lixo aconteceu. O movimento cinematográfico, um dos mais importantes do Brasil, começou nos idos da década de 1960 e 70 e ocorreu nesse lugar tão deteriorado --a futura "ex-cracolândia"-- pois era onde se concentravam os escritórios de produtoras como Columbia, Paramount e Warner desde os anos 20.

A esta altura, no entanto, a produção da Boca cresceu muito. Já tinha grandes diretores e estrelas (Helena Ramos, Matilde Mastrangi e Aldine Muller), se dividia em vertentes (a pornochanchada e o terror B de Zé do Caixão são alguns exemplos) e começou a disputar público e salas de cinema com a grande produção nacional.

Assim, do tratamento debochado que recebia por conta das produções baratas e controversas passou a ser levada a sério, e, muito mais tarde, teve reconhecida a sua importância para o cinema nacional.

Crédito: Dàrio Jose e Sérgio Pizza/Divulgação Atriz Mel Lisboa (foto) participa do espetáculo "Cine Camaleão - A Boca do Lixo", na sede Luz do Faroeste

MUDANÇA DE TEATRO

A companhia de teatro Pessoal do Faroeste homenageia o movimento com o espetáculo "Cine Camaleão - A Boca do Lixo", que tem Paulo Faria como diretor e conta a história da Boca através de uma cantora que quer ser a primeira mulher a fazer sexo explícito no país.

De maneira caleidoscópica, o espetáculo é cheio de referências à história de São Paulo --e a moça, interpretada pela grávida Mel Lisboa, acaba virando protagonista de um filme que conta a história do crime do Castelinho da Rua Apa, tragédia marcante nos anais paulistanos.

O filme, "Faroeste na Rua Apa", foi realmente feito e é projetado durante a peça. Mas, agora, a companhia quer ir além em suas homenagens à Boca do Lixo. Mudou sua sede para a rua Triunfo e tornou-se vizinha do diretor David Cardoso, a principal estrela da era de ouro da Boca.

O diretor, Faria, explica todas as mudanças --a física e os novos projetos: "Estamos no olho do furacão com toda essa polêmica da cracolândia, e, ainda assim, a peça é um sucesso". E completa: "O espaço ficou pequeno, e muita gente tinha de voltar para casa antes das sessões, por não conseguir ingresso".

"Cine Camaleão" vende ingressos num esquema "pague quanto puder". "Não cobramos na entrada. Passamos um envelope no final. A pessoa paga o quanto acha que o espetáculo vale. É bom porque não constrange nem quem quer pagar muito, nem quem quer pagar pouco. Ninguém fica sabendo, e vai quem quiser, mesmo", afirma Faria. Quem quiser reservar lugar paga R$ 30.

Crédito: Sérgio Pizza/Divulgação Cia Pessoal do Faroeste com diretor Paulo Faria (de camisa preta e branca) e David Cardoso (ao centro)

PARCERIA COM DAVID CARDOSO

Com a casa nova e maior, no centro da Boca do Lixo, a vontade de Faria --um diretor teatro-- de fazer cinema cresceu. A feliz coincidência da vizinhança com David Cardoso o motivou: o convidou para uma parceria em seu próximo filme, "A Mulher Macaco", sobre uma trupe de circo. A obra terá Vera Fischer e Mel Lisboa como mãe e filha.

"Fazer cinema e teatro nessa região é um presente da cidade. Há dez anos nesse local já fazemos um mapeamento cultural da Boca, e o próximo passo é uma revitalização desse passado", conta Faria. "Me encanta essa forma metalinguística de trabalhar uma história de São Paulo, fazendo na rua um filme sobre o passado daquela rua que, por sua vez, faz parte da história do cinema". Isso é mesmo o tipo de coisa que só a arte consegue fazer.

Informe-se sobre o espetáculo

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