'Estou em pânico', diz Paulo Miklos às vésperas de estrear no teatro

Paulo Miklos já subiu ao palco com o Titãs milhares e milhares de vezes desde o início da banda, em 1982, mas na próxima quarta-feira (20) ele vai encarar o público pela primeira vez de uma forma bem diferente: como ator.

"Eu estou em pânico", diz o artista, que já foi premiado no cinema ("É Proibido Fumar") e agora interpreta o trompetista americano que virou ícone do jazz, Chet Baker (1929-1988). O espetáculo "Chet Baker - Apenas um Sopro" fica em cartaz no CCBB às quartas, quintas e segundas.

"A peça tem a ver com a alma humana, com a miséria humana, mostra todo o risco e a armadilha do talento", explica Miklos, que ensaia há menos de dois meses e foi pegando o jeito usando o seu instinto e seguindo as "grandes dicas" do diretor José Roberto Jardim.

"A constatação é que a técnica e a disciplina são muito importantes", avalia, referindo-se à diferença entre atuar no cinema e no teatro. "Cada pequeno detalhe faz a diferença."


Escrito por Sérgio Roveri, o espetáculo é livremente inspirado na vida de Baker, que era cool, símbolo sexual e viciado em heroína. No fim da década de 1960, ele foi espancado em uma rua de São Francisco, teve sua boca rachada e perdeu muito dentes. E essa peça se passa num fictício ensaio que marcaria o retorno do jazzista —que precisou brecar sua carreira após a agressão.

Juntos, os cinco músicos em cena, que se encontram para gravar um CD, discutem, brincam e acertam contas antigas. "Eu conheço essa armadilha da prepotência, da autoconfiança", diz Miklos, que aos 24 anos já tinha música tocando no país todo ("Sonífera Ilha") e que em certo trecho da peça, como Baker, diz que é "o melhor do mundo e o mais bonito".

A única mulher da montagem é Anna Toledo, que pegou o papel de última hora, teve só duas semanas de ensaio e canta lindamente. Segundo Miklos, "a peça precisava de uma dona, ela chegou e se apoderou". As canções são ao vivo, e o time de atores/músicos ainda conta com Jonathas Joba (que teve aulas de contrabaixo), Piero Damiani (piano) e Ladislau Kardos (bateria).

Saiba mais sobre a peça



PALAVRAS DE PAULO MIKLOS

  • "Nós, que somos músicos e agora atores, estamos nos apoiando na Anna [Toledo] e no [Jonathas] Joba, que é um ator que tem mais experiência, o palco pra ele é uma coisa.... em cena, você ter dois pilares assim, dá pra gente poder arriscar um pouco. Você tem aquela baliza, uma coisa que te serve de referência."
  • "As dicas todas vieram do diretor, do Zé [José Roberto Jardim], as grandes dicas. E aí eu usei o meu instinto, que é o que eu tenho usado nos últimos 15 anos que eu estou atuando no cinema, na TV e no teatro."
  • "A constatação é como a técnica e a disciplina são importantes. No cinema, você tem muito uma coisa do momento, do instante, o diretor pode mudar de ideia sobre a mesma cena no mesmo dia, pedir pra você mudar a ideia de coisa. E o teatro, ao contrário disso, é aquela coisa diária da repetição, de você dar a vida novamente à mesma situação. Isso é uma coisa maravilhosa porque é sempre uma nova experiência."
  • "Eu intuía isso, achava que podia ser isso, mas só aqui, agora, pra eu ter certeza absoluta de como é importante seguir as marcações. Cada pequeno detalhe é discutido, interiorizado e conscientizado. Mil coisas que você vai descobrindo aos poucos. Coisas que, às vezes, parecem detalhes tão pequenos. Mas cada pequeno detalhe disso é muito grande."
  • "Isso tudo ainda é uma grande incógnita pra mim. Eu estou em pânico, mas ainda vai ser uma grande descoberta. Tem sido um barato, e só vai fazer sentido no momento em que você estiver respirando junto com as pessoas, aí você vai sentir o retorno de cada palavra, de cada situação. Eu acho que aí é que vai ter o sentido da comunicação, da expressão, do riso. Onde tem graça? Onde é um riso nervoso? Onde é denso? Até onde você pode levar as pessoas?."
  • "Eu continuo com a agenda com a minha banda [Titãs], que é prioritariamente aos fins de semana. Mas no dia 21 [quinta], que é meu aniversário, eu tenho peça e show depois, num evento fechado. Eu vou sair daqui [CCBB] e vou correndo para lá. Vai ser um dia de comemoração, as minhas paixões todas juntas. Um dia especial."
  • "Eu tenho uma identificação com a história da peça porque eu sou músico, eu conheço essa armadilha da prepotência, a autoconfiança demasiada e onde isso pode levar. É algo que eu já senti na pele, algo que eu já me questionei, porque eu estou na profissão desde moleque."
  • "Eu comecei antes dos 20, e com 24 eu tinha uma música tocando no país inteiro, "Sonífera Ilha". E de lá para cá tenho uma carreira longa, então eu sei o que é esse drama, esse abismo. O personagem me trouxe a possibilidade de falar disso, tô podendo fazer um acerto de contas."
  • "Acho que um trabalho é ideal quando ele consegue unir estas duas coisas: se atirar para o futuro, para uma coisa desconhecida, aprender muito com algo que te tirou da sua zona de conforto, e, de outra maneira, também mexer com a tua experiência de vida, jogar luz sobre aquilo que você sente mais profundamente."
  • "Para quem não conhece Chet Baker, eu indico ouvir "Almost Blue", que é uma música maravilhosa e serviu de referência. E também tem o fantástico documentário "Let's Get Lost", sobre a vida dele, feito por um fotógrafo [Bruce Weber] que era muito amigo dele e que o fotografou durante toda sua trajetória. Ele fala com a família, com as várias mulheres e também com o próprio Chet."

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