Descrição de chapéu Semana de 1922
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Villa-Lobos ao som de funk celebra a Semana de Arte Moderna nas periferias de SP

Programação das Fábricas de Cultura tem ainda releituras de obras de Tarsila e batalhas de slam

Músicos em pé em palco escuro

Ensaio do 'Concerto Modernista', apresentação das Fábricas de Cultura que une arranjos de Villa-Lobos ao rap e ao funk Divulgação

São Paulo

Cem anos depois de Heitor Villa-Lobos subir ao palco do Theatro Municipal —com um pé com sapato e outro com chinelo, dizem— e se tornar o representante musical mais importante da Semana de Arte Moderna de 1922, o compositor volta a ser celebrado no centenário do evento. Mas, desta vez, bem longe da região central de São Paulo. E com o rap e o funk se unindo à sua composição clássica.

Como parte da extensa programação promovida na capital paulista para relembrar os cem anos da Semana de 1922, a Fábrica de Cultura Sapopemba, na zona leste, recebe no dia 18 o Concerto Modernista. Assim como outros eventos da programação chamada de "Modernismo Hoje", ele se dedica a imaginar como aqueles dias ressoam na ótica das periferias da cidade atualmente.

Andreia Vigo, assessora técnica da Secretaria de Cultura do estado, afirma que a ideia era destacar legados do modernismo —como a amplificação da arte e o rompimento com um padrão único, acadêmico.

"A gente quer que artistas das periferias digam o que é o modernismo para eles, que os artistas do centro também digam o que é o modernismo hoje, e tudo isso não tem uma forma pronta", diz ela.

Nessa perspectiva, cabem dinâmicas de reescrever os manifestos emblemáticos "Pau-Brasil" e "Antropófago", além de contação de histórias, campeonatos de slam e mostras com releituras de obras modernistas por grafiteiros.

No espaço escolhido para o Concerto Modernista, a mais de 20 quilômetros de distância do Theatro Municipal, é a Orquestra de Cordas das Fábricas de Cultura da Zona Leste que executa as obras de Villa-Lobos.

Jovem se apresenta em microfone
Campeonato de slam 'Semana de 22, 100 Anos Depois', promovido pela Biblioteca de São Paulo - Divulgação

O grupo toca as composições como foram feitas, mas, no fim do espetáculo, incorpora aos instrumentos clássicos os beats do DJ Beto Premier e as rimas de Ronne Cruz e MC Yuri. Eles cantam a inédita "Três Rios", que tem letra cheia de alusões ao modernismo e à realidade das periferias.

Para Ronne, rapper que faz parte do trio Monarckas, repensar os eventos da Semana de 1922 é importante para colocar a cultura periférica em pé de igualdade com o que aconteceu naquela semana centralizada.

"A cultura sempre foi elitista e não via a periferia e o gueto como expressões artísticas", diz ele. O que a gente quer mostrar é que a arte não é só aquele padrão europeu, que a proposta artística periférica tem o mesmo peso de qualquer arte que a gente vê no mundo. O que muda é de onde e sob qual circunstância você conta essa história."

Já na zona norte, um dos destaques é a exposição "22 Periférico", que fica aberta até o dia 27 deste mês na Fábrica de Cultura Brasilândia e segue para outros espaços durante este ano. Nela são reunidas releituras de cinco artistas para obras de alguns dos nomes que encabeçaram o modernismo, como Tarsila do Amaral, Oswald de Andrade e Anita Malfatti.

"A gente sabe que foi um movimento de intelectuais predominantemente brancos e do centro, então foi sensacional ver isso chegando aqui um século depois, com artistas periféricos tendo essa consciência crítica sobre a semana", diz Júlia Maria, que é conselheira administrativa na Poiesis, organização que cuida de parte da programação nas Fábricas de Cultura.

E se o objetivo é aproximar o modernismo dessa produção artística contemporânea, para Renato Barreiros, um dos coordenadores das Fábricas de Cultura da zona leste, o que esses dois grupos mais têm em comum é a abertura a novas linguagens.

Ele exemplifica que, numa ação no aniversário de São Paulo, jovens refizeram "Sampa", de Caetano Veloso, no ritmo de piseiro, enquanto "Trem das Onze", de Adoniran Barbosa, se tornou uma canção de trap —quase numa retomada antropofágica.

"Dar o olhar deles não quer dizer que é melhor ou que é pior, que se busca conflito", diz ele. "O que estamos fazendo, de alguma forma, é reabrir as obras modernistas."

O que ver de 'Modernismo Hoje' nas periferias

  • 'Concerto Modernista', na Fábrica de Cultura de Sapopemba. R. Augustin Luberti, 300, Sapopemba, região leste. 18/2, às 19h. Grátis
  • Mostra '22 Periférico', na Fábrica de Cultura da Brasilândia. Av. General Penha Brasil, 2508, Brasilândia, região norte. Até 27/2. Grátis
  • Mostra 'Abaporu Periférico', na Fábrica de Cultura de Sapopemba. R. Augustin Luberti, 300, Sapopemba, região leste. Até 24/2. Grátis

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