Motivada pela afirmativa de que a revista é o gênero de teatro que melhor representa a ideia que o Brasil tem de si, ou seja, o samba, o futebol e a mulher, a diretora, dramaturga e pesquisadora Neyde Veneziano mergulhou em uma série de pesquisas para compreender o que seria a nova identidade do país —e como o gênero poderia retratá-la.
A resposta surgiu com um novo discurso, pautado em liberdade, inclusão e igualdade. Foi dessa premissa que nasceu "Revista Babadeira", espetáculo em que Veneziano atualiza a linguagem, os temas e as discussões em volta do teatro de revista brasileiro com um elenco formado por dez drag queens.
Com dramaturgia assinada por Veneziano, Dagoberto Feliz e das drags Alexia Twister e Thelores Drag, além de canções originais compostas por Danilo Dunas, o espetáculo tem apresentações gratuitas de sexta a domingo, no Espaço Cia. de Revista, e fica em cartaz até 19 de março.
"Eu já estava de olho nas drags, porque acho que muda completamente. A drag é a comunicação do exagero, é a hipérbole da mulher. Mas ninguém está querendo fazer o tipo de gracinha que faziam com as mulheres. Não temos piadas apoiadas nos atributos femininos, embora seja um espetáculo sensual e glamouroso", explica a diretora.
Para ela, a montagem brinca com o duplo sentido dentro da arte drag sem jamais oferecer munição para que a figura feminina ou o corpo da mulher sejam estereotipados. "As revistas faziam com que as vedetes tivessem a imagem de burras e gostosas, e elas nunca foram burras, mas faziam essa caricatura."
Embora tenha uma linha dramatúrgica que Veneziano lê como frágil, "Revista Babadeira" se preocupa muito mais com o formato do que necessariamente com a história.
Em cena, duas drags seguem em busca de um tema sobre o qual possam escrever para um projeto contemplado com um fomento. Após trocar ideias com os deuses do Olimpo, a dupla se depara com um sertanejo universitário à procura de seu tio, expulso da cidade por causa da homofobia. O espetáculo enfileira músicas e quadros que resultam numa celebração à liberdade.
Para completar, a montagem também explora as feridas sociais deixadas pela pandemia e pelos anos de governo Bolsonaro. "Nós rimos das nossas injustiças, dos nossos problemas, é uma característica brasileira e de resistência também", diz.
"Tem uma hora que imitamos o Bolsonaro falando sobre a cloroquina, mas tratamos de vários momentos críticos sobre a situação brasileira. Tudo no invólucro da comédia, mas sabendo que estamos tratando de um assunto sério, que foi a pandemia, que é a crise política."
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