A comunicação direta com o público é o grande banquete que sacia o Grupo Galpão desde a sua fundação, em 1982, entre corredores universitários e as ruas de Belo Horizonte. Neste ano, a trupe teatral completa quatro décadas sem nunca ter interrompido as atividades.
Após um período marcado pelos desafios impostos pela pandemia de Covid-19 e por políticas culturais debilitadas, o grupo vem retomando a agenda presencial aos poucos. Em São Paulo, a trupe celebra a efeméride com uma temporada de três espetáculos, encenados entre 3 e 17 de dezembro, em diferentes espaços da capital.
A agenda começa com "De Tempo Somos" (2014), apresentado no teatro Flávio Império, em Cangaíba, na região leste, neste sábado, 3, e domingo, 4. Os demais, por sua vez, ocupam palcos na região central: "Till, A Saga de um Herói Torto" (2009), é encenado no teatro Procópio Ferreira, no bairro de Cerqueira César, de terça, 6, a quinta, 8, e "Nós" (2016), no Centro Cultural Olido, na República, de 14 a 17.
Em formato de sarau, "De Tempo Somos" reúne canções e fragmentos de textos de autores como Eduardo Galeano e Jack Kerouac. Já a tragicomédia medieval "Till, A Saga de um Herói Torto" dá luz a um típico anti-herói dotado de artimanhas, enquanto "Nós" propõe um denso jogo de cena que debate questões como violência e intolerância.
Mesmo com um trabalho consolidado em termos de pesquisa, memória e repertório, somando 24 espetáculos próprios e outras estatísticas que o dispõe como um dos coletivos mais representativos do teatro brasileiro contemporâneo, o Galpão não fugiu à regra e enfrentou sérias dificuldades para permanecer em atividade na pandemia.
A estratégia adotada por eles, também usada por outros grupos ao redor do país, foi desenvolver experiências cênicas em formatos híbridos em plataformas digitais, o que garantiu a continuidade de processos de pesquisa e experimentação do grupo e, não menos importante, a entrada de receita para mantê-lo sustentável.
"Quando a pandemia eclodiu, estávamos em vias de estrear um espetáculo sobre poetas brasileiros, que acabou se transformando em outros produtos, como peças virtuais e pequenos filmes. Foi um processo complexo e desafiador, especialmente diante de um governo que impôs obstáculos claros à cultura. Hoje vemos isso como um 'tour de force' que ressaltou a capacidade de sobrevivência de um grupo teatral que quase não seguiu em frente", diz Eduardo Moreira, um dos fundadores do coletivo.
Ações como o projeto "Dramaturgias", no qual dramaturgos e diretores de relevo foram convidados para desenvolver cenas curtas, e a peça virtual "Sonhos de uma Noite com o Galpão", construída a partir de relatos de sonhos na pandemia, com direção de Pedro Brício, estiveram no escopo do grupo durante esse período, além do lançamento do livro "Grupo Galpão: Tempos de Viver e de Contar", com textos críticos, ensaios e imagens.
Aos 81 anos, a atriz Teuda Bara, também no grupo desde a sua fundação, esteve afastada nos últimos meses para cuidar da saúde. Na temporada atual, ela volta à cena em "Nós".
"Retomar o contato presencial com o público e celebrar 40 anos de Galpão depois de tempos sombrios é uma alegria. O teatro sempre teve esse papel de resiliência, de humanidade, de levar às pessoas a consciência de estar no mundo. E nós vamos dar a volta por cima. Estou com toda a força para lutar ainda mais um tiquinho", diz a atriz.
Para 2023, as energias do coletivo estão voltadas para um espetáculo-cabaré baseado na obra de Bertolt Brecht, com direção de Eduardo Moreira e Júlio Maciel, além da continuidade de projetos de oficinas e ações com parceiros.
Para a atriz e diretora Inês Peixoto, na trupe há 30 anos, os textos de Brecht seguem refletindo o que vivemos enquanto humanidade. "Isso se conecta ao que o Galpão vem construindo continuamente ao longo dessas décadas e ao que o próprio teatro se propõe, que é sensibilizar as pessoas, ser um esteio de seu tempo", afirma.
"O teatro, como tentamos acionar no coletivo, é um exercício diário de diálogo, democracia e empatia —que são elementos que precisam ser potencializados entre nós com urgência", conclui Peixoto.
TEMPORADA GALPÃO 40 ANOS
De Tempo Somos
Direção: Lydia Del Picchia e Simone Ordones. Com: Antonio Edson, Beto Franco e Eduardo Moreira. Teatro Flávio Império - r. Prof. Alves Pedroso, 600, Cangaíba, região leste. Livre. Sáb. (3) e dom. (4), às 18h. Grátis
Till, A Saga de um Herói Torto
Direção: Júlio Maciel. Texto: Luís Alberto de Abreu. Com: Antonio Edson, Beto Franco e Eliseu Custódio. Teatro Procópio Ferreira - r. Augusta, 2.823, Cerqueira César, região central. Livre. Ter. e qua., às 21h; qui., às 18h e 21h. De 6/12 a 8/12. R$ 40 em sympla.com.br
Nós
Direção: Marcio Abreu. Texto: Marcio Abreu e Eduardo Moreira. Com: Antonio Edson, Beto Franco e Eduardo Moreira. Centro Cultural Olido - av. São João, 473, região central. 16 anos. Qua. a sáb., às 19h. De 14/12 a 17/12. Grátis
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