Em cena, um jovem Ney Matogrosso trava os primeiros embates corpo a corpo com seu pai, um militar conservador que não aceita o relacionamento sensível que o filho desenvolve com a arte e a natureza.
Em paralelo, o elenco canta "Sangue Latino", dos Secos e Molhados. Na cena seguinte, um grupo de militares experimenta suas primeiras relações homossexuais enquanto interpretam a sedutora "Por Debaixo dos Panos".
Estas são duas das primeiras cenas que compõem "Ney Matogrosso - Homem com H", musical que chega ao palco do 033 Rooftop nesta sexta-feira, dia 9, com a meta de apresentar uma radiografia da trajetória de um dos principais intérpretes da música popular no Brasil.
Com texto assinado por Emílio Boechat e Marília Toledo, que também assina a direção ao lado de Fernanda Chamma, o musical é um dos desdobramentos de uma série de homenagens aos 80 anos que Matogrosso completou em 2021. A principal, e ainda inédita, é um filme produzido pela mesma Paris Filmes, que, com seu braço teatral, põe em cena o musical.
"Esse é o condutor do espetáculo. Tanto a dramaturgia quanto a cenografia se pautaram por essa liberdade que o Ney sempre teve de ser quem ele quisesse ser, então nós escolhemos brincar no cenário com esse conceito de parque de diversões, que se transforma, tem um escorregador, um balanço, um trepa-trepa, essa coisa de criança de ser o que é", explica.
Fã do artista desde a infância, quando o via como uma espécie de desenho animado, Toledo mergulhou ao lado de Boechat no repertório gravado pelo cantor ao longo de quase 50 anos e 37 discos, pescando canções que consideravam significativas para narrar trechos da vida do personagem, além de contar com uma assessoria do próprio cantor.
"Ele nos pediu só uma coisa: que contássemos só a verdade. Então fomos atrás das músicas que ajudassem a narrar essa trajetória. A intolerância do pai o levou para a aeronáutica no Rio, depois um amigo o leva para o Hospital de Base em Brasília, outro para cantar em coral e fazer teatro, aí conhece a Luhli, que o apresenta para o João Ricardo —e o resto é história."
A trajetória pouco ortodoxa do intérprete chega à cena no corpo de um ator com um caminho também pouco comum. Embora já tenha dado vida a Matogrosso em uma das cenas do musical que contou a vida de Chacrinha, Renan Mattos havia decidido dar uma pausa na carreira após a pandemia e uma segunda operação no joelho que, pensou, o tiraria do mercado teatral.
Entretanto, um convite da produção o fez repensar e encarar a bateria de testes que lhe renderam seu primeiro protagonista.
"É uma responsabilidade, mas é também uma diversão, um prazer muito grande, porque eu não faço mais nada, senão ouvir o Ney. Eu não vejo mais filmes, não vejo o noticiário, não escuto rádio, tudo o que eu ouço é o Ney, todos os vídeos que eu vejo são dele, todas as entrevistas, porque eu não quero fazer uma cópia, mas quero absorver aquilo tudo", afirma.
Com temporada prevista até 30 de outubro, o musical pretende fugir da linguagem clássica do gênero, ao apresentar fragmentos da vida de Matogrosso, buscando destacar muito mais passagens específicas do que uma trajetória completa.
"O Ney é essa personagem que não dá para colocar em uma caixa, por isso o musical é assim, viaja por tantos lugares diferentes", afirma Fernanda Chamma. "Como você faz uma coreografia, uma partitura para ele? Não faz. Tentamos contar essa história de uma forma que pareça ser improvisada, mas não é. É tudo muito bem ensaiado."
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