Enquanto no centro de São Paulo, em frente à B3, um touro dourado arma um ataque, a cerca de 11 km dali, no empreendimento B32, na avenida Faria Lima, uma baleia prateada abre o ventre.
O "Touro de Ouro", instalado em frente à Bolsa de Valores brasileira, na r. 15 de Novembro, não durou um dia sem protestos. A réplica do animal de bronze de Wall Street recebeu na manhã de quarta (17) um lambe-lambe com a palavra "fome".
Já a baleia do empreendimento B32, por ora, tem atraído o humor na internet.
A escultura metálica de 6 m de altura por 20 m de comprimento dá as boas-vindas a quem chega à praça do B32, aberta ao público e em torno da qual se articulam uma torre comercial e um teatro.
Na manhã desta quarta, por volta das 9h, enquanto os convidados chegavam para um debate no interior do teatro, o perfil Faria Lima Elevator propunha uma enquete no Twitter.
"Já temos um nome para essa mais nova obra de arte do Condado?" —Condado é o apelido dado à região da Faria Lima, centro financeiro de São Paulo.
Os comentários foram de elogios, muitos dos quais comparando a baleia ao touro, a associações menos lisonjeiras, de cunho sexual. Uma hora depois, o vencedor era decretado pelo Faria Lima Elevator: Sardinhão.
Acontece que, se no linguajar dos agentes financeiros, o touro é um sinal auspicioso de alta no mercado, "sardinhas" são os pequenos investidores, de pretensões menores se comparados aos "tubarões".
Porém, embora o mercado tenha um pé na B3 e outro no B32 e adjacências, as intenções de Rafael Birmann, à frente do empreendimento na Faria Lima, não eram homenagear nenhum tipo de investidor.
A proposta de ter uma elemento na esquina, que ajudasse a fazer da praça um marco, foi do arquiteto paisagista americano Thomas Balsley, que assina o design da praça do B32.
A forma que esse elemento teria veio quando Birmann folheava uma "revista velha" numa sala de espera de um consultório. Nas páginas da publicação, deu com uma obra do coletivo cubano de arte Los Carpinteros —hoje uma dupla, Marco Castillo e Dagoberto Rodríguez.
Era uma estrutura ovalada com um bar dentro. Birmann, porém, quis ir além, fazendo um "negócio artístico, mas com significado". Na verdade, vários significados.
"Na mitologia e na literatura, baleias simbolizam o renascimento", diz o empresário, lembrando o episódio bíblico de Jonas, engolido pelo animal, "o resgate da noção de humanidade" em "Pinóquio" —na narrativa de Carlo Collodi, Gepeto é quem vai parar na barriga do cetáceo— e "a busca por realizar sonhos e objetivos", em "Moby Dick", relato da obsessão do capitão Ahab por uma enorme baleia branca, escrito por Herman Melville.
"Todas dimensões bem humanas", resume ele, compreensões inspiradas por um animal que "não sugere o enfrentamento, e sim a cooperação, a parceria". Neste sentido, "a baleia é um contraponto ao que o touro representa", defende o empresário.
"Não é um símbolo importado dos Estados Unidos ou de qualquer outro lugar, pois foi proposta e criada por nós, uma equipe multinacional e multidisciplinar, vem da criatividade e do espírito colaborativo."
Além de serem animais que viajam em grupos, "sociais como nós", frisa Birmann, os cetáceos são também "um símbolo de superação e de respeito ao ambiente", tendo sido alvo de "uma das primeiras campanhas globais de preservação", Salvem as Baleias.
São Paulo, define Birmann, é ela própria um Leviatã, o caos do qual saímos modificados, como quem passa pela barriga da baleia.
A perspectiva é levada ao pé da letra, pois a escultura é penetrável, ficando aberta a todos até as 20h ou 21h. "É o nosso convite para a transformação de cada um de nós e de todos juntos, para que São Paulo se torne uma cidade mais sensível e humana."
Horário e outras regras eventuais não estão definidas por ora. "Esperamos que as pessoas usem dessa liberdade com consciência, respeitando a obra sem danificá-lo", diz Birmann.
O empreendedor aposta que logo a baleia se tornará um marco referencial na paisagem, como a escultura "Cloud Gate", do artista indo-britânico Anish Kapoor, em Chicago.
Só que, se uma obra desse porte custa "US$ 20, 30 milhões, a nossa nós fizemos com R$ 2 milhões", ri Birmann, emendando depois que "não é a mesma coisa, não".
A baleia do B32 tem criação coletiva. Os primeiros desenhos foram de Pedro Birmann, filho de Rafael.
Brincando com um programa de modelagem —"levanta o rabo, engorda aqui", lembra o empresário—, chegaram à forma atual, concretizada pelo trabalho de uma equipe de técnicos, engenheiros, calculistas e outros, coordenada pelo arquiteto Renato Silva.
Para celebrar o engajamento não só dos criadores da baleia como dos demais que trabalharam no empreendimento, haverá uma cerimônia, com jantar e show, na noite desta quarta, no teatro B32. Fornecedores e projetistas receberão uma carta e uma pequena escultura com a forma da baleia.
"É uma obra de arte sem artista. Alguém permite?", indaga Birmann.
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