Jornalistas da Folha contam qual casa de shows ocupa lugar de afeto em suas memórias em SP

Na capital, espaços vão além de suas estruturas físicas

São Paulo

Uma casa de shows é muito mais do que cimento, concreto, ferro, madeira e um bocado de amplificadores. As estruturas duras se encantam quando uma banda ou um cantor sozinho dá vida a seu repertório para um bocado de fantásticos, admiradores ou gente que simplesmente não tinha nada melhor para fazer naquela noite.

Além da exposição à música ao vivo, essas casas marcam encontros entre pessoas e são espaços de geração de memórias afetivas. Por isso, para além da eleição desta edição d’O Melhor de São Paulo, convidamos jornalistas fãs de música da Redação da Folha para contarem qual é a casa de shows paulistana em atividade que mais marcou a história de cada um. Veja a seguir.

Caetano Veloso durante show no Espaço Unimed, em São Paulo, em celebração ao disco 'Transa', de 1972. O cantor veste uma camisa de manga longa vermelha e canta com os braços abertos no palco com fundo escuro
Caetano Veloso durante show no Espaço Unimed, em São Paulo, em celebração ao disco 'Transa', de 1972 - Rafael Strabelli/Divulgação

Bárbara Blum, repórter do Todas
Sesc Pompeia
As casas de show em São Paulo vêm e vão com uma velocidade difícil de acompanhar. Numa lista afetiva como essa, eu poderia citar outras, onde vivi mais coisa —a Via Funchal onde eu, nos meus 15 anos, vi Franz Ferdinand e Vampire Weekend, ou a Casa do Mancha, onde nos apinhávamos nos cômodos e janelas para ver Boogarins. Citaria até a Mas elas estão na lista das que foram. No coração e na cidade, sobra o Sesc, com sua estrutura gigantesca, proposta democrática e programação fina. Impossível ver um show ali sem topar uns 20 amigos. Como tem que ser.


Carolina Moraes, repórter e produtora do podcast Café da Manhã
Sesc Vila Mariana
O Sesc Vila Mariana ficava entre minha casa e a escola onde estudei por muitos anos. Na adolescência e começo da vida adulta, seu teatro deu um contorno pra cidade em que, descobri ali, gosto de viver. Deu pra riscar da lista as apresentações de ídolos, como Gal Costa, conhecer bandas que nunca mais parei de ouvir, como Metá Metá, e ver pela primeira vez as apresentações de álbuns que marcaram uma fase inteira da vida, como o "Climão", da Letrux. No Vila Mariana couberam os passeios com a família, as idas solitárias a shows e as paradas de uma longa noite de Virada Cultural com os amigos.


Daigo Oliva, editor da Homepage
Sesc Pompeia
Lugar mais democrático de São Paulo devido aos preços praticados e à qualidade dos serviços que oferece, o Sesc Pompeia tem na choperia talvez a sua maior marca. Lá, vi bandas tão diversas quanto Television e El Guincho, sempre perto dos artistas, sem grades que separassem palco e público. Foi lá também que vi pela primeira vez o Teenage Fanclub, obsessão indie desde a adolescência, com ingressos de última hora que meu irmão conseguiu. Qualidade de som e ambiente excelentes em um espaço com o tamanho certo: nem tão grande que faça a pessoa lá atrás ver a banda como um pontinho nem tão pequeno a ponto de espantar bandas de porte médio e grande.

Guilherme Luis, repórter da Ilustrada
Espaço Unimed
Nos últimos anos frequentei tanto o Espaço Unimed, saudoso das Américas, que fui forçado a gostar de lá. A disposição da pista não é das melhores, é verdade, e às vezes o calor sufoca, mas vi ali artistas que me marcaram no passado —uma Demi Lovato roqueira, Avril Lavigne num desânimo que é só dela e Pitty, mais recentemente, que me fez suar com o pula-pula da turnê de 20 anos do "Admirável Chip Novo".


Jairo Marques, editor de Vida Pública
Tokio Marine Hall
O Luiz Melodia tinha morrido naquele dia e havia um clima de consternação entre o público, ambiente mais do que propício para que Nando Reis, Gilberto Gil e, soberanamente, Gal, entoassem Pérola Negra e arrancassem lágrimas, emoção e gritos do público. Na Tokio Marine Hall finquei na lembrança da minha eternidade aquele momento, mas também um outro do Chico Buarque cantando a pedrada na Geni, outro de Bethânia descansa declamando o Brasil e o amor e ainda um da Vanessa da Mata dançando divinamente com aquele cabelão. Ainda bem.


João Perassolo, repórter da Ilustrada
Espaço Unimed
Perdi a conta de quantas vezes bati cabelo nos shows de metal que vi no Espaço Unimed, que para mim sempre será o Espaço das Américas. Foi lá que assisti à despedida do Slayer —uma das minhas bandas preferidas—, duas vezes Megadeth e, no ano passado, o surto coletivo que foi a apresentação do Gojira. O som é muito bom em qualquer lugar da casa, os acessos ao bar e ao banheiro são rápidos e o ar-condicionado em geral funciona. Fora que tem um espaço para fumar um cigarrinho. O que mais um metaleiro poderia querer?

Magê Flores, editora de Podcasts
Sesc Pompeia
Uma casa de shows pode ser um lugar de congregação na mais árida das cidades. Estabelecer, desde cedo, uma relação com um espaço assim é ter uma lista de memórias que podem salvar sua relação com a cidade toda. Foi no Sesc Pompeia que furei pela primeira vez a classificação indicativa de um show (acompanhada dos meus pais), que fui a meu primeiro show sozinha, que fui a muitos shows acompanhada de amigos, de paixões e de namorados e que fui pela primeira vez a um show com um bebê na barriga (sem nem saber disso ainda). Recomendo uma casa de show de estimação a todos. Se ela puder ser acolhedora como a do Sesc Pompeia, tanto melhor.


Manoella Smith, repórter da coluna Mônica Bergamo
Cine Joia
O formato em diamante, com o chão levemente inclinado, é extremamente amigável para o público baixinho com menos de 1,60 m de altura (eu!), e dá para chegar bem perto do palco. A capacidade do espaço é um ótimo meio-termo. Ao mesmo tempo que permite uma apresentação com ares intimistas, comporta gente suficiente para proporcionar aquele sentimento de catarse. O Cine Joia é um desses lugares que costuma receber aquela banda ou dupla não tão conhecidas que você adora e não esperava que viesse ao Brasil tão cedo.


Nadine Nascimento, editora-assistente da Ilustrada
Vibra SP
Minha casa de shows favorita quase não resistiu aos impactos da pandemia. O antigo Credicard Hall encerrou suas atividades em 2021, para se tornar a Vibra São Paulo, em 2022. Foi lá, em 2019, que assisti pela primeira vez a um show de Maria Bethânia com minha avó Regina —a grande responsável por me tornar fã da cantora. Na noite fria e chuvosa de dois de agosto daquele ano, a abelha rainha aqueceu o público com seu show "Claros Breus", um facho de luz no início de uma fase obscurantista para a cultura no Brasil. A Vibra São Paulo enche os olhos pela grandiosidade, conforto e acústica impecável. Voltei lá em 2022, de novo para ver Maria Bethânia, mas com a turnê "Fevereiros". Na primeira vez assisti ao show da mesa VIP e na segunda, do camarote, ambas as experiências marcaram minha vida para sempre.

Priscila Camazano, repórter de Política
Audio e Espaço Unimed
Tenho lembranças de muitos shows de hip-hop que fui na vida, mas o do De La Soul, na Audio, em 2016, foi marcante. Ter a oportunidade de ver o trio ao vivo foi de arrepiar. Outra lembrança que tenho da casa foi a de assistir ao show da Iza na estreia da turnê de seu primeiro disco, "Dona de Mim", com participação especial de Gloria Groove, em 2018. Me lembro de ficar encantada com a potência das duas no palco. Ainda falando de rap, um dos meus gêneros favoritos, não posso deixar de mencionar o show de lançamento do disco "Cores e Valores" dos Racionais MC's, no então Espaço das Américas —hoje, Unimed—, em 2014. Na casa, também vi shows históricos do Criolo e do Emicida. Boas lembranças!


Roberto de Oliveira, editor de Projetos Especiais & Parcerias
Espaço Unimed
Um dos discos mais fundamentais da história da música brasileira, "Transa", álbum de 1972, foi reproduzido ao vivo diante de uma multidão, que lotou o Espaço Unimed, numa espécie de catarse coletiva. Foi um momento histórico em novembro de 2023. Caetano Veloso comandou o espetáculo de tal forma que a sensação era a de estarmos no gargarejo de um palquinho intimista. Na verdade, estávamos em transe. Talvez por estar perto de onde vivo ou quem sabe pela diversidade de repertório —saudade Los Hermanos; volta logo Ivete—, o antigo Espaço das Américas ocupe um lugar privilegiado na memória afetiva. Naquela madrugada, dispensei o Uber. Caminhei, ao lado de um amigo dos tempos de devoção também às capas de vinil, por quase 2 km até em casa. Uma pergunta nos fez companhia: "Pra que rimar amor e dor?"

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