Fake news e Audrey Hepburn se misturam em 'Infâmia', peça online do Grupo XIX de Teatro

Companhia retoma o filme homônimo de 1961, sobre duas professoras acusadas falsamente

São Paulo

Trancadas em casa, as personagens vividas por Audrey Hepburn e Shirley MacLaine, duas professoras, se veem às voltas com como sair daquele ambiente. Nesse filme de 1961, ambas viviam o drama de uma mentira que se espalhou, sobre elas terem uma relação amorosa.

Agora, o Grupo XIX de Teatro retoma essa e outras cenas do filme de William Wyler, que foi baseado num texto dramatúrgico da década de 1930, de Lilian Hellman. Na nova versão, que se desenrola online, eles discutem o que vivemos hoje em termos de invenção de mentiras, com a discussão em torno das notícias falsas que ganharam ainda mais tração nos últimos anos.

Na tela central do Zoom, imagem de filme preto e branco com duas mulheres; na lateral inferior direita, duas pequenas telas de Zoom com outras duas mulheres que falam ao microfone
Trecho de 'Infâmia', do Grupo XIX de Teatro, inspirado em peça dos anos 1930 que se tornou filme com Audrey Hepburn - Flavio Barollo/Divulgação

O que chamam de experimento cênico de "Infâmia", já que não é uma peça finalizada e acontece com a interação e debate com o público, vem na esteira de outros experimentos do grupo com filmes. Mas a escolha desse título, em especial, foi alinhada aos debates dos tempos atuais.

"Ele aparece em paralelo com a nossa discussão em torno do teatro, do cinema, mas também dessa enxurrada de fake news", afirma o diretor, Luiz Fernando Marques. Antes da estreia, neste sábado (10), a agenda do grupo foi aberta na última quarta, dia 7, com um debate com Patrícia Campos Mello, repórter da Folha, que falou sobre seu livro "Máquina do Ódio", sobre campanhas de desinformação.

Na apresentação, usando cenas do próprio filme, atores do grupo dublam alguns trechos e seguem o texto do longa-metragem à risca em alguns momentos. Em outros, eles flertam com a ideia de deepfake, uma falsificação profunda e proposital da realidade.

"Quando estudar a biografia da Lilian Hellman, parece algo muito distante, são quase cem anos desde que ela escreveu a peça, que é da década de 1930. Ao mesmo tempo é muito revelador. Toda essa caça às bruxas, colocar o outro em desconfiança, é algo que foi muito usado na política", diz Marques.

São questões que estão no texto de Hellman e que são transportadas para o filme de 1961 —e que agora encontra ecos na montagem do Grupo XIX de Teatro. "Você vai criando essa mentira e a fomentando. Quando se vê, ela está gigante e ninguém mais consegue achar o início disso."

A trama também levanta discussões da discriminação de um amor lésbico e da sexualidade, temas frequentes nas pesquisas do grupo.

A cena que abre o processo também dialoga com o confinamento atual, provocado pela pandemia de coronavírus. Sem poder sair de casa por causa de uma boataria sem freios, Audrey Hepburn e Shirley MacLaine mimetizam esse isolamento múltiplo —que pode ser gerado por uma mentira, por um preconceito e, hoje, por uma pandemia descontrolada.

Experimento cênico de Infâmia

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