Com atuações incríveis, "Pillowman" fala de tortura e crianças mortas

A peça acaba e você demora a se recompor, é tudo muito intenso, muita coisa pra pensar. Em "The Pillowman - O Homem Travesseiro", escrito por Martin McDonagh (que ganhou Oscar em 2006 pelo curta-metragem "Six Shooter"), um escritor é torturado sob a acusação de matar criancinhas, já que alguns de seus contos contêm detalhes idênticos aos dos assassinatos.

Seu irmão deficiente mental também fica detido pelos policiais, dois, que misturam humor negro e pancadaria para conseguir a confissão. Em meio a uma estética grotesca e personagens bizarros, o público se vê diante de histórias tristes demais e de cenas bem engraçadas.


"O texto é cheio de reviravoltas, nada do que você espera é o que de fato acontece", conta o ator Flavio Tolezani, que interpreta de forma incrível Katurian, o escritor. Corcunda e com um ferimento na testa, ele tenta convencer todo mundo de que é inocente, e não esconde o orgulho que tem de suas histórias. "As transformações físicas mais carregadas são baseadas nas deformidades do pensamento que ele expõe ao longo da peça", explica.

Já Bruno Guida, que divide a direção de "Pillowman" com Dagoberto Feliz, entrou para o elenco de última hora como o policial Ariel, após a saída de um dos atores --foram só quatro dias de ensaio. "Os colegas foram generosos comigo e me ajudaram", diz o artista, que também é o idealizador e produtor da peça.

Outro destaque do elenco é Bruno Autran, que se transforma no irmão Michal --ele tem problemas mentais, vive aos cuidados de Katurian e se envolve nas histórias cruéis das crianças mortas. Quem faz o investigador Tupolski é Daniel Infantini, que dá um show ao incorporar o visual esquisito e o jeito excêntrico do personagem.

O ator Wandré Gouveia é o responsável por costurar todas as informações e contar detalhes da vida dos dois presos, além de fazer uma participação inusitada no final.

A peça está em cartaz no Viga, centro cultural que fica pertinho do metrô Sumaré (zona oeste de São Paulo). Os ingressos custam R$ 30 (sextas) e R$ 40 (sábados e domingos).

Abaixo, leia entrevista com o ator e diretor Bruno Guida e com Flavio Tolezani.

Informe-se sobre a peça


Crédito: João Caldas/Divulgação Wandré Gouveia, Flavio Tolezani, Bruno Autran, Bruno Guida e Daniel Infantini (esq. p/ dir.) estão em "Pillowman"

ENTREVISTA COM O DIRETOR E ATOR BRUNO GUIDA

Guia Folha - Você idealizou e produziu o espetáculo. O que te levou a lutar pelo projeto?
Bruno Guida - Um amigo inglês me sugeriu esse texto há 4 anos. Fiquei com vontade de montá-lo porque ele tem uma profundidade incrível e, ao mesmo tempo, é entretenimento da mais alta qualidade, pois tem inúmeras reviravoltas que prendem a plateia na história. É muito dificil achar uma peça que una essas duas coisas. O texto também permite fazer uma comédia, um drama, paródias, e até, por que não, ter momentos de "stand-up", numa só montagem, fazendo a plateia ir das gargalhadas até as lágrimas. Isso me interessou demais. Também foi bacana idealizar o projeto e me envolver diretamente em todas as etapas dele, desde a compra dos direitos, tradução, leis de incentivo, busca de patrocínio, direção, produção e, agora, atuação também.

Você teve pouquíssimos dias para ensaiar. No princípio, nem tinha cogitado atuar?
Eu não tinha cogitado fazer parte do elenco pois sempre quis dirigir a peça, e achei que não tivesse capacidade para fazer as duas coisas ao mesmo tempo, ainda mais fazendo parte da produção também. Um outro ator que ensaiou conosco acabou saindo da montagem perto da estreia, e eu e o Dagoberto Feliz, que dirigiu a montagem comigo, achamos que o mais lógico seria eu mesmo entrar, pois tinha a peça toda na cabeça.

Foi divertido por um lado, pois, depois da peça pronta, o diretor dá o brinquedo para os atores e fica vendo eles se divertirem. Agora eu voltei pro jogo também. Os colegas foram generosos e me ajudaram. O ruim é que não consigo ver uma parte da peça porque fico na coxia, e lá não tem visão. Então quando não estou em cena sou todo ouvidos para poder dar um "feedback" aos atores. Dá um pouco mais de trabalho, mas é muitíssimo mais divertido!


Crédito: João Caldas/Divulgação Flavio Tolezani (esquerda) e Bruno Autran em cena do espetáculo "The Pillowman", em cartaz no Viga

BATE-PAPO COM FLAVIO TOLEZANI

Guia Folha - Você está irreconhecível na peça, o jeito de falar, a postura, a roupa etc. É mais difícil fazer um personagem assim?
Flavio Tolezani - Todo personagem, em toda peça, tem sua especificidade, sua dificuldade. Esse personagem, dentro da linguagem escolhida pela encenação, demandou algumas transformações físicas mais carregadas, tudo baseado nas deformidades do pensamento que ele expõe ao longo da peça. Não sei te responder sobre o "tamanho" da dificuldade, mas posso dizer que é extremamente prazeroso fazer um trabalho assim.

O que mais chamou sua atenção quando leu o texto pela primeira vez?
Já venho lendo esse texto há tanto tempo, e cada vez que releio ou penso nele mais me surpreendo. Nada do que você espera é o que de fato acontece. O texto é cheio de reviravoltas. O encadeamento nada lógico das ações prende a atenção e nos passa a perna o tempo todo. É fascinante a naturalidade e o humor com que trata de acontecimentos extremamente bizarros. O humor sem pudor.

Acha que Katurian, sua personagem, é só vítima da história toda?
Não. Ele não é só vítima. Ele é também um agente causador. Todos temos responsabilidade sobre o que dizemos, fazemos ou deixamos de fazer.

Informe-se sobre a peça

Comentários

Ver todos os comentários Comentar esta reportagem

Últimas

Ver mais