Descrição de chapéu Crítica
Restaurantes

Merenda da Cidade oferece comida de qualidade, mas não vale o hype

Pratos são feitos com bons ingredientes e técnicas, só que não surpreendem o público

São Paulo

Merenda da Cidade

Não há dúvidas de que Janaina Rueda é uma grande chef. Apontada recentemente como a melhor mulher nesta posição na América Latina, ela está à frente de alguns dos mais premiados restaurantes de São Paulo e liderou movimento de recuperação do centro da cidade. Merece o reconhecimento que tem.

Isto posto, nada justifica a badalação em torno do seu novo Merenda da Cidade, disputado, com longas filas e que vem sendo tratado como um dos melhores lugares para comer bem e barato na capital paulista.

Depois de almoçar nele cinco vezes, de segunda a sexta em uma semana recente, é preciso apontar que o restaurante não vale a visita nem merece a popularidade que vem encontrando.

Não que a comida servida ali não seja boa. Longe disso. Rueda demonstra domínio de técnica e usa ótimos ingredientes ao preparar de forma competente pratos tradicionais dos pê-efes de São Paulo.

Restaurante Merenda da Cidade da chef Janaina Torres RuedaVirado à Paulista
Virado à Paulista do restaurante Merenda da Cidade, da chef Janaina Torres Rueda - Mauro Holanda/Divulgação

O virado à paulista de segunda é gostoso, traz feijões com ótima textura e um pedaço de barriga de porco digno do 12ª melhor restaurante do mundo --além de uma salada de couve e um tartare de banana que dão refrescância e vida ao prato.

O frango com polenta de terça nem estava tão suculento, mas se destacava pela pele crocante e pelo quiabo grelhado que trazia por cima. O estrogonofe servido às quartas tem carne macia e um molho de creme de leite bem feito, sem ketchup de segunda categoria. A massa ao molho bolonhesa de quinta era fresca, cozida na hora e servida al dente, como deve ser. E a peixada de sexta tinha um caldo suculento e bem temperado.

Mas um restaurante não é só a comida que serve, e há muitos dissabores em um almoço do Merenda.

Para começar, por mais que sejam de alta qualidade, todos os pratos servidos são bem ordinários. Mesmo quando feitos com esmero, dificilmente surpreendem.

Além disso, há a limitação de servir apenas um prato por dia. A proposta é ousada, mas torna o local entediante, dificulta a conciliação de juntar várias pessoas para comer juntas e cria um certo cansaço —na semana das visitas, a sobremesa recebida foi o mesmo brownie quatro vezes.

Pode-se ainda questionar o conceito de restaurante barato. As refeições custam R$ 45, mas uma refeição no Sudeste custa em média R$ 49,33 e no mesmo bairro central há vários restaurantes populares oferecendo refeições a partir de R$ 12.

Mas o maior contratempo diz respeito à vivência como um todo de fazer uma refeição no Merenda. Falta ali o que os americanos costumam chamar de "hospitality", que se refere a todo o trabalho de fornecer comida e bebida para clientes de forma a oferecer a melhor experiência possível. Pode parecer frescura, mas não é. Mesmo com comida boa, comer no Merenda não é agradável.

Merenda da Cidade, da chef Janaina Torres Rueda
Merenda da Cidade, da chef Janaina Torres Rueda - Rogerio Gomes/Divulgação

Ao recriar a experiência de um refeitório estilo bandejão, o empreendimento de Rueda faz lembrar o Bom Prato, restaurante do governo que oferece refeições por R$ 1 para populações vulneráveis.

Comer no Merenda da Cidade é tratar a alimentação como mero abastecimento para corpo (e para as redes sociais). A comida pode ser de qualidade, mas come-se de forma rápida, apertada e sem muita interação sob a pressão de uma grande rotatividade e sem um ambiente para convivialidade.

Além das filas típicas de refeitórios e self-services, ao sentar-se em mesas comunitárias apertadas ao lado de desconhecidos cria-se um clima estranho. Com uma bandeja abarrotada de recipientes (prato, salada, sobremesa, bebida, talheres), almoçar ali evoca ainda a experiência desconfortável de uma refeição em um avião (na classe econômica).

Isso tira dos clientes algumas das principais partes da experiência de comer fora de casa. Falta a vivência de ser recebido, sentar-se sem pressa, ser servido, conversar, comer com calma e bem acomodado, descansar, ter um momento confortável como um todo. Sem isso, não dá vontade de voltar ali.

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