Casa da Matrona, misto de bar e lanchonete, tem humor e causa social em SP

Espaço inspirado na casa de matriarcas é marcado pela decoração de antiguidades

Fernanda Campos
São Paulo

Um galpão de 300 metros quadrados reformado e transformado em ponto gastronômico decorado com móveis retrô, placas engraçadinhas e cacarecos dos anos 1980 e 1990 chama a atenção na Vila Zelina, bairro de imigrantes da Europa Oriental na zona leste de São Paulo.

O idealizador do espaço, inaugurado em junho de 2022, é o descendente de moldavos Ivan Alatxeve, de 50 anos. O nome da casa é uma homenagem à sua avó paterna, Yalange Matrona Trifon, que migrou sozinha da Moldávia para o Brasil aos 17 anos.

Casa da Matrona na Vila Zelina - Rubens Cavallari/Folhapress

Boa parte dos objetos —entre eles, máquinas de escrever, baús, TVs de tubos e discos de vinil que abarrotam as estantes— e dos diversos quadros religiosos que cobrem as paredes são da coleção pessoal de Alatxeve e sua família, garimpos que fez em feiras e bazares de igrejas e presentes dados pelos próprios clientes que se identificam com o espaço.

No salão, ao lado de máquinas de fliperama com jogos como "Pinball" e "Pac-Man", está instalada uma estação de cerveja artesanal com tanques de inox à vista. Quem é responsável pela produção são os mestres cervejeiros Guilherme Lapa e Rafael Zapala, que criam um sabor temporário a cada mês, além das cervejas IPA, pilsen e lager, fixas no cardápio e que giram entre R$ 15 e R$ 23 o copo de 450 mililitros.

Além de drinques, doses, vinhos e bebidas não alcoólicas, o relacionamento do fundador com descendentes de russos que trabalham com importação de bebidas garante algo difícil de se encontrar em bares paulistanos: levas de vodcas vindas diretamente da Rússia como a Kalashnikov, produzida pela destilaria Glazov, uma das mais antigas do país.

Alatxeve investiu na própria marca de cafés, a Matrona Cafés Especiais, e torra os grãos vindos de pequenos produtores do sul de Minas Gerais e interior de São Paulo em uma máquina nos fundos do salão.

Os pacotes de cafés também são vendidos em parcerias com diversas ONGs, como a Compassiva, que atende a crianças, adolescentes, mulheres e refugiados em situação de vulnerabilidade na cidade, tendo parte do lucro revertida para essas instituições.

Casa da Matrona na Vila Zelina - Rubens Cavallari/Folhapress

O empresário decidiu pôr em prática o negócio após contrair Covid em 2020 e sofrer complicações graves. Ele teve 85% do pulmão comprometido, dois derrames, trombose e restrições cognitivas. "Quando tive a possibilidade real de me encontrar com a morte, comecei a questionar sobre o impacto que gero na vida das pessoas e qual o legado que deixarei", conta.

Quando se recuperou, saiu da sociedade de uma empresa que prestava consultoria na área de varejo de alimentos e começou a desenhar o modelo de negócios do Matrona misturando diferentes sistemas que aprendeu em mais de 30 anos de carreira. O resultado foi um modelo de negócio colaborativo em que o lucro é dividido com quem trabalha na operação da casa.

Atualmente, investidores do Matrona compartilham 50% do faturamento com a equipe formada por 10 funcionários. "Quem fica na operação não investe dinheiro, mas investe tempo e trabalho. O objetivo é que eles possam empreender em seus próprios negócios no futuro", explica.

Além da divisão dos rendimentos, um dos princípios do estabelecimento é o acolhimento; fazer os clientes "se sentirem em casa" por meio de um atendimento simpático e cortesias de água, café e torradas.

Mas a Matrona também tem senso de humor —"humor tosco", segundo idealizador. O ambiente é repleto de frases e objetos cômicos como as regras da casa pintadas na parede próxima à entrada ("tenta não morrer aqui" e "não esqueça de ir embora"), brinquedos desbotados e bonecas maquiadas como a banda Kiss reforçam a atmosfera kitsch.

O tom jocoso também se estende aos nomes dos itens do menu, que contempla lanches artesanais e porções que variam de R$ 15 a R$ 49. Um dos mais pedidos é o crássicuzão, hambúrguer com disco de carne de 130 gramas, queijo prato, molhos barbecue da casa defumado e de alho e agrião servido no pão selado na manteiga, indicado para "forrar o bucho de um ser tosco".

Funcionando de quinta a domingo, o palco recebe músicos independentes que navegam entre o rock, pop rock, jazz e blues. A programação flexível, que pode incluir noites de karaokê e cozinheiros convidados, é divulgada na rede social da casa.

Casa da Matrona

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