Na calçada lotada em frente ao Z Deli, a hostess estima o tempo de espera em número de mesas. "Estamos com 32 na frente. Quer deixar o nome?", diz, sorrindo, com uma tranquilidade que não combina com a frase que acaba de falar. O "sim, quero" sai sem pensar. E o impulso é recompensado pela constatação de que é possível começar a comer ali mesmo.
A dica é ficar à espreita para aboletar-se no bar que abre para a calçada. Mesmo em pé, fica confortável encostar no balcão para provar a culinária judaica servida ali. Na nova fase da casa de Julio Raw, à frente do grupo Z Deli ao lado do sócio, Bruno Mester, a muvuca e o menu combinam mais com turmas do que com casais.
Melhor também para pedir entradas e compartilhar. Como latkes (panquecas de batata, R$ 28), manjubinha curtida (R$ 24), varenique (massa recheada de batata, R$ 36) e alcachofra à Judeia (R$ 29). As alcachofras chegam delicadamente empanadas, embaixo de uma chuva de pecorino e sobre um aveludado aïoli —infelizmente sem sinal do toque de anchovas descrito no menu.
Mais um motivo para ir com amigos é que há mais mesas para quatro pessoas do que para duas. E casais correm o risco de ser acomodados no bar. Tudo bem se você não se incomodar em ficar de costas para o serviço, o que requer certo contorcionismo para fazer o pedido.
Mesmo lotado, o ambiente é aconchegante —luz baixa, sofazinhos, cortina de veludo, lustres e espelhos retrô. O jazz alto eleva o volume das conversas e rende um ar um tanto caótico. Apesar disso, a brigada se mantém serena, cordial e disposta.
Água da casa e couvert (bagel e manteiga de tutano) chegam sem precisar pedir. E não são cobrados. O maître surge em seguida e indica os principais: bife de chorizo (R$ 98), prime rib (R$ 188) e farfel caldoso (massa cozida no suco liberado por aves durante o cozimento) com pato (R$ 79).
Essa massa miudinha envolta no caldo espesso contrasta com uma cebola crocante. No ponto ideal, os pedaços de peito de pato desmancham na boca. Dá pra sentir o sabor de cada ingrediente.
Fica claro que você não está mais diante de uma cozinha afetiva, vocação original do Z Deli quando abriu as portas, há mais de 40 anos. A casa, que nasceu como um pequeno salão de comida kosher pelas mãos de Rosa (avó de Julio), Zenaide (tia-avó) e Lonka Lucki, agora apresenta uma cozinha de autor —comandada na prática pelo chef Benê Souza.
Nesse contexto, o wagyu de pastrami (R$ 89) parece ser tentativa de inovar. O resultado é saboroso, mas não se justifica. Se o objetivo dos dias de preparo do pastrami é amaciar uma carne dura, para que usar uma opção que já é macia? As fritas que acompanham mereciam um preparo à altura da cozinha.
Entre as sobremesas, o cheesecake (R$ 38) conquista com calda ácida que escorre no recheio liso, cremoso, levemente salgado. Uma alegria.
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