Bar Brahma, Bar Léo, Riviera, Filial, Orfeu, Blue Note, Bar dos Arcos, Love Story. Pode parecer que a única coisa em comum entre esses endereços de São Paulo seja o fato de eles serem pontos históricos ou badalados da cidade. Mas não. Todos são administrados ou têm entre os sócios o mesmo nome —a empresa com o sugestivo nome Fábrica de Bares, que vem dominando certo circuito da noite paulistana.
Liderado pelo empresário Cairê Aoas, o grupo teve como uma de suas últimas tacadas trazer de volta à vida o Filial. O bar clássico da Vila Madalena passou 22 meses com as portas fechadas sob ameaças de se despedir definitivamente. Mas a casa reabriu para o público nesta quarta, dia 26, após ter a operação assumida pela empresa de Aoas.
Apesar do peso histórico e até uma certa mitologia acerca de muitas das casas que gere —afinal, o que dizer da esquina da Ipiranga com a São João, imortalizada por Caetano Veloso em "Sampa" e onde fica o Bar Brahma?—, Aoas não é o típico dono de boteco.
Aos 38 anos, ele parece mais um empresário da Faria Lima, que usa palavras como "conceito", "case", "experiência" e "ecossistema" para falar dos negócios. No release, a marca, criada em 2014, é definida como um "hub de desenvolvimento, gestão e operação de estabelecimentos como bares, restaurantes e casas de show".
"Foi tudo muito por acaso. A empresa não nasceu pensada para ser o que é hoje", conta ele, que soma 25 anos trabalhando com a noite e que vem de uma família cujos caminhos se cruzam com o do centro da capital.
O avô, filho de libaneses, trabalhou como ambulante, relojoeiro e caneteiro na região da rua 15 de Novembro desde os anos 1950. O pai abriu uma pastelaria também no centro. "Foi a maneira que ele achou para trazer algum sustento para a família." Depois, passou a comandar o Café São Paulo Antigo, no largo da Santa Cecília, nos anos 1990. "Como era pouco frequentado durante a noite, meu pai teve a ideia de colocar uma programação de música ao vivo."
Segundo Aoas, o sucesso do São Paulo Antigo durou cerca de 20 anos e foi o que levou o pai a abraçar o resgate do Bar Brahma como missão. Também foi nessa época que ele começou a trabalhar com a família, aos 13 anos.
Fundado em 1948 por um imigrante alemão, o Bar Brahma chegou a fechar as portas nos anos 1990 e reabriu em 1997 com novo nome, São João 677, e chope Kaiser nas torneiras. Logo fechou de novo.
O pai de Aoas, Álvaro, assumiu o local em 2001. "Ele queria resgatar esse ponto muito importante para a cidade e para a cultura do centro", diz. Então apostou na criação do Camarote Brahma aos moldes do que já existia no Rio de Janeiro e, novamente, na música ao vivo. "Foi quando Cauby Peixoto e Angela Maria, que nunca tinham pisado nos palcos do Brahma, começaram a se apresentar", diz.
Depois do Brahma, veio o resgate do Léo. Na rua Aurora desde 1940, o boteco fechou as portas após um escândalo envolvendo a venda de chope pirata, em 2012. A família Aoas arrendou a marca e, em quatro meses, o local ressurgiu com promessas de volta à tradição. "Aí começou essa nossa visão de olhar para marcas tradicionais de São Paulo e entender o que a gente poderia fazer ali."
O aumento do portfólio também trouxe críticas de quem reclama que a Fábrica de Bares descaracteriza os espaços tradicionais, pasteurizando de certa forma o espírito dos lugares.
O empresário reconhece que muita gente torce o nariz para a administração profissional. "É claro que perde um pouco da pessoalidade", diz Aoas. Para ele, o grupo faz o máximo para tentar preservar o que chama de essência do bar. "O que a gente faz é contribuir com gestão, escala e relações comerciais para dar uma nova perenidade para a casa."
No caso do Léo, eles chegaram a convidar os clientes para conversar e mandavam um carro para buscar Luiz, o garçom mais antigo da casa, para levá-lo ao trabalho. Conhecido como Luizinho, ele esteve por 55 anos no local, até o ano de sua morte, em 2017, aos 96. "A gente manteve até o jeito de tirar o chope, que é diferente do Bar Brahma."
Já no Filial, o resgate mais recente da companhia, os maiores cuidados foram com a gastronomia e o horário de funcionamento –o endereço é famoso por ficar aberto até altas horas. "Mais do que manter o cardápio, a gente quis valorizar a essência da casa. Então convidamos o Rômulo Morente, do Moela, que é um bar que a gente acha que faz a síntese do que é a gastronomia de boteco hoje", afirma.
Até o fim do ano, o grupo inaugura mais um bar —o Duco ao lado do Bar Brahma, em uma rara iniciativa criada do zero. Além disso, abrem também o novo Love Cabaré, no lugar do antigo Love Story, uma parceria com o empresário Facundo Guerra e a rede de motéis Lush. Por fim, assumem o hotel Marabá, também no centro. Isso sem falar nas três casas que abrem em Brasília até o fim do ano –no total, são cinco por lá.
"Nós somos apaixonados pelo centro. Por incrível que pareça, tem muito paulistano que não conhece a região. Isso é um problema, mas também uma oportunidade", diz Aoas, no melhor estilo business.
A Fábrica de Bares demorou alguns anos para tomar a forma que tem hoje —depois do Léo, o negócio seguinte foi o Jacaré, na Vila Madalena, que passou a fazer parte do portfólio apenas em 2018. Hoje são 19 casas e alguns braços internos. É o caso da FabLab, uma "aceleradora de iniciativas e ideias voltadas para a disrupção do segmento de bares e restaurantes", nas palavras da companhia, cujo desenvolvimento ocorreu durante a pandemia.
"Hoje a gente tenta se entender mais como um ecossistema de marcas, produtos, endereços do que somente uma operadora", reflete. Mas os bares ainda têm chopes nas torneiras.
Bar Brahma
Av. São João, 677, Centro. Instagram @barbrahma
Bar Léo
R. Aurora, 100, Santa Ifigênia. barleo.com.br
Bar Filial
R. Fidalga, 254, Vila Madalena. Instagram @barfilial
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