Foi dando uma molhadinha de dedo num copo de caipirinha que Thiago Gregorio descobriu, ainda moleque, o gosto da mistura de limão e açúcar com cachaça.
O ambiente de festas de adultos, que se reuniam para as tradicionais feijoadas de sua mãe, dona Lara de Jesus, era propício a essa aventura gustativa. A família reunia-se à mesa ao som de Alcione, cuja voz saía dos LPs tocados na antiga vitrola, enquanto a matriarca, devota de Nossa Senhora e Oxalá, agradecia mais um dia de vida.
Ao reler o passado, parece que aquele tempo já sinalizava um caminho: por que não transformar um pequeno prazer em uma profissão?
Entre os 32 drinques e os cerca de 300 rótulos disponíveis no cardápio do bar onde ele trabalha, existem clássicos que já conquistaram o paladar da clientela, como o negroni envelhecido em barris de carvalho ou o fitzgerald, que combina gim, angostura, limão-siciliano e xarope de açúcar, só que nada disso supera, na opinião de Gregorio, o sabor da tradicional caipirinha.
Quando corta o limão para preparar a bebida no trabalho, o perfume cítrico desprendido da fruta é a deixa para revolver as lembranças.
Criado pela mãe na casa erguida no terreno dos bisavós maternos, na Penha, zona leste de São Paulo, onde ainda mora, Gregorio era um adolescente que estudava em escola pública e sonhava viver nos Estados Unidos, quando surgiu um curso piloto de bartender. Era oferecido pela Diageo, num programa voltado para jovens carentes, ainda mantido pelo gigante de origem inglesa, um dos principais fabricantes de bebidas no mundo —outras informações estão no perfil do Instagram @learningforlife_br.
Já formado, foi convidado para um evento que iria reunir 60 empresários da América Latina de diferentes setores na capital paulista. Nele estava Fabrizio Fasano (1935-2018), fundador da rede de hotéis e restaurantes que carrega o sobrenome italiano.
“Associava a marca, o nome, a um lugar de requinte”, recorda-se Gregorio. “Sempre fui curioso para conhecer o restaurante.” Com a abertura do hotel Fasano São Paulo, em 2003, o restaurante, que ficava na rua Haddock Lobo, foi transferido para a rua Vittorio Fasano —nome do avô de Fabrizio. Assim tinha início a jornada de Gregorio no grupo.
Ele começou lavando copos, tirando café, cortando frutas, enfim, fazendo o que fosse preciso como ajudante de bar do restaurante nos Jardins, área nobre de São Paulo.
De seus 40 anos, 20 deles passou trabalhando no bar: de ajudante a bartender até ser promovido a chefe de bar.
Para o colega Manoel Beato, Gregorio consegue ter uma tranquilidade, uma singeleza, tanto com o cliente quanto com a equipe. “É carinhoso, simpático, sempre com vontade de aprender, reciclar, escutando, pesquisando. Um cara completo”, conta o sommelier do restaurante Fasano.
Gregorio conhece os clientes mais fiéis pelo nome. Numa única noite, chega a preparar cem drinques.
Recentemente, participou de um encontro entre funcionários do grupo para discutir questões ligadas à diversidade e ao preconceito. Diz que sempre foi tratado com respeito. “Nunca sofri racismo no trabalho”, afirma. “Tenho orgulho da minha trajetória, mas quem se orgulha ainda mais dela é a minha mãe.”
Na segunda, dia 30, quando a mãe, Lara, completa 64 anos, a música favorita dela, “Bate Palma Aê”, de Alcione, vai rolar lá na Penha. O brinde, é claro, será com caipirinha.
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