Descrição de chapéu África
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Culinária e costumes africanos marcam pratos da cozinha brasileira; saiba onde encontrar em SP

Para celebrar o Dia da Consciência Negra, conheça receitas que resgatam memória ancestral africana

São Paulo

No preparo de uma receita pode haver influências do passado, pitadas de ancestralidade e referências trazidas de outros cantos do mundo. E a cultura africana se faz presente quando ingredientes são misturados, aquecidos, cozinhados, fritos e refogados para preparar um bobó de camarão, por exemplo.

Neste sábado, dia 20, é celebrado o Dia da Consciência Negra em homenagem ao líder quilombola Zumbi dos Palmares —uma data que é propícia para investigar e valorizar a cultura afro-brasileira.

Apesar das referências empregadas na culinária brasileira terem origens diversas, é possível encontrar traços de africanidade em pratos servidos na maior parte do país. Seja de forma abudante ou com mais timidez, ingredientes africanos fazem parte da tradição culinária brasileira.

Ilustração mostra mesa de com diversas comidas em cima, vatapá, mungunzá, bobó, caruru, acarajé, moqueca. Mãos se servem
Culinária brasileira é marcada por povos africanos - Carolina Daffara

E não foi só na comida que aqueles vindos de várias partes da África deixaram sua marca. Para Vilson Caetano, pós-doutor em Antropologia e professor de gastronomia na Escola de Nutrição da Universidade Federal da Bahia (UFBA), os nossos hábitos alimentares, a forma como arrumamos a mesa, os utensílios que utilizamos e até o ritual de compartilhar o alimento vêm dos povos africanos.

Apesar da contribuição gastronômica, este processo não ocorreu de forma harmônica, afirma Max Jaques, chef e pesquisador do Instituto Brasil a Gosto. Muito desta influência pode vir da época em que o Brasil era uma colônia e os africanos, escravizados, cumpriam a função de cozinheiros nas casas de famílias brancas. "Nós nos apropriamos do conhecimento africano através de um processo de escravidão", diz Jaques.

Há ainda quem tenha precisado da culinária para se entender como pessoa negra. Tanea Romão, que se considera uma "pesquisadora de ingredientes, saberes e sabores tradicionais", é também chef de cozinha. Ela conta que foi só quando criou o restaurante Kitanda, em 2009, que se entendeu como uma mulher preta e começou a investigar o próprio passado. Romão, que tinha 42 anos de idade naquela época, quis entender a própria ancestralidade.

Depois de participar de um reality show, Romão teve seu restaurante reformado, agora chamado Casa da Tanea, mas a pandemia veio e, desde então, a chef entregou marmitas e quitutes. O restaurante só reabriu recentemente, em 30 de outubro.

Romão vêm pesquisando e aprofundando seus conhecimentos sobre a culinária africana desde a abertura do restaurante. Hoje ela se orgulha da posição que ocupa. "Onde a gente costuma ver preto na cozinha? Lavando louça", diz.

O Dia da Consciência Negra existe para, sobretudo, causar reflexão, lembrar do passado e exaltar as lutas do povo preto que vive no Brasil. Para marcar a data, veja alguns pratos da cultura afro-brasileira e saiba onde comê-los em São Paulo.

Acarajé

O acarajé é um prato africano enraizado na cultura brasileira. As baianas do acarajé, mulheres que vendem a iguaria em tabuleiros, são consideradas patrimônio histórico cultural do Brasil. O acarajé é um bolinho de feijão-fradinho, frito no azeite de dendê, ingrediente presente nos principais pratos da culinária afro-brasileira.

No continente africano, o prato é conhecido como akara e, especificamente no norte da Nigéria, é chamado de kosai. O termo vem do iorubá, uma das maiores etnias do continente, e significa comer bola de fogo —"akará" quer dizer bola de fogo e "jé", "comer". O significado se relaciona com a história de Xangô e Iansã, orixás do candomblé.

O quitute pode ser servido com ou sem pimenta e é recheado com caruru, vatapá e camarão seco. Na época em que o Brasil era uma colônia, o acarajé era parte da mercadoria das escravas de ganho, que iam para as ruas vender coisas e levar aos seus senhores o dinheiro.

No centro de São Paulo, a casa Rota do Acarajé é uma das que servem o quitute. Por R$ 29,80, prova-se o bolinho de feijão-fradinho servido no prato acompanhado de vatapá, camarão-seco, caruru e salada.
Rota do Acarajé - r. Martim Francisco 529/530, Santa Cecília, região central. Instagram @rotadoacaraje. Delivery p/ tel. (11) 3666-8200, (11) 3668-6222 ou (11) 2528-7304


Bobó

O bobó tem origem africana e também é popular na Bahia. Quando chegou ao Brasil, a receita era feita com inhame-da-costa, até que, por influência da cultura índígena, passou a levar mandioca –foi assim que se tornou o bobó. Presente também em rituais religiosos, o prato recebe o nome de ipeté no candomblé e é a comida do orixá Oxum.

Ele pode ser feito com os tubérculos em geral e até milho, além de frango, camarão e carne-seca. Mas o ingrediente mais característico do bobó é o azeite de dendê. Para acompanhar, arroz de coco e farofa.

O restaurante Badejo, na zona sul de São Paulo, serve um bobó de camarão a R$ 172, em uma porção que serve duas pessoas e tem 400 gramas de camarão.
Badejo - av. Moema, 265, Moema, região sul, tel. (11) 5055-0238. Delivery p/ tel. (11) 5055-0238 ou (11) 5052-6890

Bobó de camarão do restaurante Badejo
Bobó de camarão do restaurante Badejo - Divulgação

Caruru

​Outro prato tradicional no Recôncavo Baiano é o caruru, que veio da África e é preparado com quiabos cortados em pequenos pedaços —e que também leva azeite de dendê. Em setembro, o caruru é feito em homenagem aos Ibejis, divindades gêmeas que protegem as crianças no candomblé e que foram sincretizadas aos santos Cosme e Damião.

Para a cozinheira Hanna Jasmineiro, do Projeto Tereza, o prato representa a festividade das comemorações feitas em setembro. O caruru do Projeto Tereza, assim como o das festas, é acompanhado por itens como vatapá, farofa e arroz. Já o restaurante Ponto do Acarajé SP prepara um caruru de acarajé, com 250 gramas, que sai a R$ 20.

Ponto do Acarajé SP - av. Sapopemba, 4.830, Vila Diva, região leste. Delivery via iFood, Uber Eats ou pelo WhatsApp (11) 95373-8083

Projeto Tereza - Apenas delivery. Os pedidos devem ser feitos pelo Instagram @projetotereza ou pelo WhatsApp (11) 96156-5877. O cardápio de opções e valores de caruru estará disponível no Instagram a partir de sábado, dia 20. Os pratos serão entregues, via delivery, no sábado (27) ou no domingo (28), mas a reserva deve ser feita até a noite de quinta-feira, dia 25. Os pedidos podem ser retirados no bairro Bela Vista ou entregues na casa do cliente, mediante à taxa

No Projeto Tereza, a cozinheira Hanna Carla entrega menus por encomenda; na foto, caruru, o prato de setembro e outubro
No Projeto Tereza, a cozinheira Hanna Carla entrega menus por encomenda; na foto, um caruru - Vinícius Branco/Divulgação

Moqueca

O prato tradicional pode levar azeite de dendê, leite de coco, coentro e tomate. Há versões com carne de boi, peixe e até camarão. A receita também inclui tubérculos, como mandioca ou inhame, e hortaliças. Os temperos podem mudar em cada região do país –no Espírito Santo, por exemplo, usa-se óleo de urucum, que marca uma tradição indígena.

O prato é comumente servido na Angola e, com variações, também em São Paulo. Uma dica é ir à Casa da Tanea, que serve às sextas-feiras uma moqueca de peixe feita com leite de coco —o preparo integra um menu composto por entrada, prato principal, sobremesa e café que custa R$ 63 por pessoa. Já no restaurante Consulado Baiano, é possível encontrar uma moqueca de camarão (R$ 189,90), que acompanha arroz, pirão de peixe e farofa de dendê —atenção, pois o valor pode variar no delivery.
Casa da Tanea - r. Catão, 893, Vila Romana, região oeste. Delivery p/ WhatsApp, no (11) 94288-8007
Consulado Baiano - av. Pedroso de Morais, 853, Pinheiros, tel. (11) 2611-0202. Delivery p/ iFood ou Rappi


Mungunzá

O mungunzá é um prato afro-brasileiro que tem no modo de preparo uma influência da culinária africana. Ele pode ser servido doce ou salgado e, nesta última versão, se assemelha à chupada do Cabo Verde, preparado com milho e sal.

A palavra mungunzá vem do quimbundo mu'kunza, que significa milho cozido, mas há também quem diga que sua origem veio do quicongo —ambos são dialetos falados em partes da Angola.

A receita também é conhecido como canjica no sul e sudeste do Brasil. Para quem quiser experimentar um mungunzá em São Paulo, a Casa da Tanea tem duas opções: para comer no local, o pote com 200 gramas custa R$ 15; a porção para viagem, por sua vez, R$ 19. O mungunzá preparado por lá leva leite de coco e tem versões com ou sem amendoim.
Casa da Tanea - r. Catão, 893, Vila Romana, região oeste. Delivery pelo WhatsApp (11) 94288-8007

Mungunzá servido na Casa de Tanea, em versão com ou sem amendoim
Mungunzá servido na Casa da Tanea, em versão com ou sem amendoim - Divulgação

Vatapá

O vatapá, que foi alvo de polêmica no fim de semana ao aparecer em uma marmita provada por Wagner Moura, é típico da culinária afro-brasileira. O vatapá mais comum é feito com galinha e leva também vinagre, alho, cebola e sal. Depois, entra o leite de coco misturado com farinha de arroz, camarão, pimenta-malagueta, iguaria trazida do continente africano, e azeite dendê, outro ingrediente típico do continente.

A receita chegou ao Brasil por meio dos Iorubá, grupo étnico-linguístico da África Ocidental. Não é apenas na Bahia que o prato é tradicional, mas também em estados do Norte do país, como Amapá, Pará, Rondônia e Amazonas. O que muda de uma região para outra são alguns ingredientes, como gengibre, amendoim, cravo, castanha de caju, leite desnatado, azeite de oliva. A proteína do vatapá também pode mudar e existem variações com camarão, peixe, bacalhau ou frango.

O restaurante Baiano de Dois, em Pinheiros, oferece uma versão com camarão, servida com arroz e farofa amarela por R$ 199,90. O valor pode variar no delivery.

Baiano de Dois - av. Pedroso de Morais, 853, Pinheiros, região oeste, tel. (11) 2611-0202. Delivery p/ iFood ou Rappi

Vatapá de camarão do restaurante Baiano de Dois
Vatapá de camarão do restaurante Baiano de Dois - Divulgação

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