Passaria despercebido o minúsculo Prato Grego, restaurante escondido em uma galeria labiríntica no Bom Retiro, não fosse o estatelar de pratos quebrando ou os inúmeros vídeos dos objetos estraçalhados publicados nas redes sociais do restaurante.
Ali, no centro de São Paulo, é quase obrigatório presenciar o espatifar dos pratos brancos —e participar dele. Os objetos são feitos de gesso, e não de louça, produzidos justamente para serem arremessados pelos clientes, que não pagam nada pela experiência na primeira visita, mas depois precisam desembolsar R$ 9.
O dono endereço, Stelios Moyssiadis, é filho de um grego e de uma gaúcha. Nascido e criado no Bom Retiro, só viajou à Grécia uma vez, quando ainda era criança, mas cultiva o seu lado, digamos, helênico na convivência com a comunidade de imigrantes do bairro. Foi assim que, em julho de 2020, surgiu o restaurante.
O salão passaria facilmente por sede de um fã clube do país europeu. É repleto de objetos temáticos, fotos de amigos e familiares, colunas clássicas, bustos de gregos ilustres, tabuleiros de gamão, bandeiras e pilhas de CDs e discos de vinil com hits do Mediterrâneo.
O cardápio é diminuto e tem pinta de pê-efe: do tamanho da fome e do bolso. Pouco lembra outros restaurantes gregos da cidade, mesmo o tradicionalíssimo vizinho de bairro, o Acrópolis, já que não serve nem planeja servir frutos do mar.
Mas não sai perdendo, porque não tem firulas. De entrada, a boa salada grega (R$ 25) tem azeitonas, tomates, cebola crua, pepino e a estrela: o queijo feta.
A forrada no estômago fica por conta da mussacá, a lasanha grega de berinjela com carne moída gratinada e bechamel, que custa R$ 39. A papoutsaki, meia berinjela gratinada recheada de carne moída acompanhada de salada, sai a R$ 29.
Já o carro-chefe da casa, o souvlaki (R$ 25), é uma espécie de kebab com pita caseiro e batata frita. O destaque é o iogurte, também feito na casa, que recheia as três versões possíveis do sanduíche —de frango, porco ou falafel. Mas a receita também faz as vezes de sobremesa, com mel e nozes (R$ 12), que compete de igual para igual com qualquer bolo confeitado.
A companhia aqui é café feito no briki, a panelinha típica de cobre, com pó finíssimo e sem coar. O pedido custa R$ 10. Quem estiver disposto a desafios pode pedir o frapê (R$ 10), versão espumosa e gelada.
O prato principal, literalmente, vem depois da refeição —é quando as pessoas espatifam os pratos de gesso.
Tudo começou com a produção de festas gregas para membros da associação de comerciantes do centro, em 2016. Como em uma festa grega raiz não pode faltar a quebra de pratos, a tradição foi mantida, mas com pratos normais de cerâmica.
Segundo o guia "Essential Greek Handbook", a tradição chegou a ser proibida durante o regime militar grego, nos anos 1960, e perdeu o vigor. Mas no Bom Retiro seguiu viva.
Moyssiadis teve, então, a ideia de produzir itens personalizados e que trouxessem os nomes dos convidados, aventurando-se nos moldes com gesso em 2018. A vantagem em relação à cerâmica comum, ele diz, é que é fácil de reciclar, além de ser mais leve e de produzir cacos que não machucam.
A destruição foi um sucesso, mas o mesmo não pôde ser dito da comida, inicialmente criticada por membros da comunidade, que sugeriram que a mulher dele, Andrea Sampaio, assumisse a cozinha.
Na pandemia, o casal foi testando receitas e aprimorando o souvlaki, servido em pequenos festivais a partir de junho de 2020. Essa foi a virada do sucesso. De tão bem-sucedido, ambos decidiram abrir o restaurante em tempo integral.
Com a visita pautada pela experiência de quebrar pratos, a refeição fica com ares de aperitivo —embora a comida seja completíssima. O piso de caquinho, equivalente arquitetônico paulistano das colunas gregas que também decoram o salão, parece um convite sempre aberto para arremessar e quebrar alguma coisa.
O dono do espaço ensina a jogar o prato. Precisa ser virado para baixo, como um disco. Quem pensa que é tudo uma bagunça está muito enganado —há até modalidades diferentes, como a frisbee, em que a peça é usada para quebrar uma pilha de outros pratos.
Com ares de Olimpíada, atirar o objeto como se fosse um disco faz com que ele seja espatifado sem esforços nem cerimônia. Ao fundo, os clientes do restaurante gritam "opa!" a cada som dos estilhaços pelo chão. Enquanto isso, Moyssiadis registra tudo e logo publica as cenas nas redes sociais.
Amigos e clientes fiéis dão cor ao restaurante. Um tio de Moyssiadis passa para dar um alô ao sobrinho, duas clientes apressadas comem receitas pedidas antes pelo WhatsApp, outro embala a refeição com fotos das cinco viagens que já fez ao país. É muito fácil começar conversas com estranhos em um lugar cheio de assuntos possíveis.
Por isso, fica a dica: quem procura uma refeição reservada, menos barulhenta e com nada sendo quebrado ao redor talvez se dê melhor em outro lugar.
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