Obras de arte adaptadas à pandemia enchem de sons o parque Ibirapuera

Mostra 3M chega ao seu décimo ano com discussões sobre a relação entre o indivíduo e o coletivo nas cidades

São Paulo

Obras de arte públicas costumam estar associadas a grandes dimensões —como os enormes grafites que colorem a paisagem paulistana.

Muitos dos trabalhos da Mostra 3M de Arte, que tem início neste sábado (7) no parque Ibirapuera, não apelam a escalas monumentais. Elas investem no som. Alto-falantes foram instalados no planetário, numa cápsula do tempo e até em um drone.

Instalação formada por arcos em esfera e uma espécie de bola de cristal no centro
A instalação 'Objeto Horizonte', do Coletivo Foi à Feira, ainda em processo de montagem na Mostra 3M de Arte no parque Ibirapuera; obra propõe funcionar como espécie de cápsula do tempo de desejos para uma cidade do futuro - Karina Bacci/Divulgação

À frente desta décima edição da exposição, a curadora Camila Bechelany conta que alguns artistas optaram pelo formato para se adaptarem ao contexto de pandemia, que limitou o contato entre público e obras. “É uma forma de falar para muitos”, diz.

E também de se fazer ouvir. Afinal, fala Bechelany, é quase impossível passar perto de um som e não prestar atenção no que se escuta.

Se o coronavírus modificou alguns dos projetos originais, o tema do evento não só permaneceu o mesmo, mas ganhou ainda mais relevância. A programação explora a relação do indivíduo com o espaço público, com obras que abordam assuntos como gentrificação e vigilância, passando por temas menos óbvios, caso do cultivo e da produção de alimentos.

Todos os projetos foram desenvolvidos especificamente para o parque —é a primeira vez que a mostra acontece ali, depois de três anos no largo da Batata.

Enquanto parte dos trabalhos foi selecionada por um edital público, outra parcela foi encomendada diretamente a artistas. É isso que explica a mescla de nomes novatos e outros mais experientes, como Lenora de Barros e Cinthia Marcelle, entre os participantes. Confira abaixo alguns destaques.

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Astral
O artista Rafael RG confronta astronomia e astrologia nesta intervenção sonora, montada no planetário do parque —um dos principais e mais tradicionais de São Paulo. A obra coloca frente a frente a ciência que estuda os corpos celestes e o misticismo que se debruça sobre suposta influência que eles têm sobre as pessoas. A cada semana, uma nova faixa de áudio é tocada sobre as projeções do observatório. Os sons foram gravados a partir de um debate sobre como diferentes culturas e sociedades enxergam o céu e as formações estelares.
No Planetário Professor Aristóteles Orsini


Geografia
Cinthia Marcelle traz ao Ibirapuera uma releitura de um trabalho já exibido há seis anos no Museu da Pampulha, que fica em Belo Horizonte, em Minas Gerais. A obra, que parte de uma série em que ela reflete sobre diferentes coincidências e simultaneidades, leva ao parque uma mangueira
que liga uma torneira ao lago. A cada oito metros, porém, esse tubo se desdobra em dois. O resultado dessas dezenas de divisões é um emaranhado com mais de 500 segmentos, remetendo ao delta de um rio
—ou às raízes de uma árvore.
Próximo ao portão 10


Objeto Horizonte
Qual é a cidade que você deseja no futuro? Os visitantes desta instalação, projetada pelo coletivo Foi à Feira, respondem a essa pergunta ao entrar em uma estranha esfera fincada em um dos gramados do parque. Ao ar livre, as respostas dos visitantes são então gravadas e combinadas a uma trilha sonora com tom enigmático. A ideia é, ao final da exposição, compilar esses áudios e enterrar o resultado para as gerações futuras poderem escutar, como se fosse uma espécie de cápsula do tempo com os desejos do presente.
Atrás do Planetário Professor Aristóteles Orsini


O que Ouve
Conhecida por trabalhos de videoarte em que liberta “a palavra para fora das páginas” —a descrição é do poeta Augusto de Campos—, Lenora de Barros desta vez faz as palavras voarem pelos ares, numa das poucas obras sonoras que já produziu. Uma trilha margeada por caixas de som desemboca em uma área de pouso, onde um drone com um alto-falante acoplado alça voo de tempos em tempos. Ao percorrer o caminho, o visitante ouve versos de um poema de Barros sobre o controle e a vigilância, escrito no auge da pandemia.
Atrás do Auditório Ibirapuera


Teatro Parque Arqueológico
Camila Sposati ergue, a cerca de um metro acima do chão, um teatro anatômico —auditório usado nas escolas de medicina medievais para dissecar cadáveres. Ali, estão expostos instrumentos musicais baseados na anatomia humana, feitos de cerâmica.
A curadora da mostra diz que a instalação, que será ativada por dançarinos, funciona como uma espécie de ritual que resgata uma voz oculta. E lembra que o Ibirapuera, hoje um templo modernista, pertencia a indígenas.
Ao lado da Antiga Serraria


Pq. Ibirapuera - av. Pedro Álvares Cabral, s/ nº, Vila Mariana, região sul, tel. 5575-5045. Seg. a dom.: 10h às 21h. Abertura sáb. ( 7). Até 6/12. Livre. GRÁTIS

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